26 julho 2017

"De Canção em Canção" explora a alma humana com música e drama

Trama reúne Ryan Gosling e Rooney Mara como compositores e Michael Fassbender como o produtor musical da dupla (Fotos: Metropolitan FilmExport /Divulgação)

Jean Piter


Terrence Malick tem fama de fazer filmes sem sentido, meio loucos, e um tanto cansativos, monótonos. Do tipo que você vê, quando acha que está entendendo algo, muda tudo e parece que volta à estaca zero. Como “Arvore da Vida” (2011) e “Cavaleiro de Copas” (2015). Música instrumental quase constante, ângulos incomuns de enquadramento de filmagem, câmeras em movimento, cortes bruscos, frases soltas, diálogos curtos, e atemporalidade. Personagens que não chegam a serem apresentados, crises existenciais, filosofia, sentimentos, caos, calmaria, silêncio e banalidades. São muitos os ingredientes das obras complexas do diretor norte-americano. Mas há quem ame (e muito) esse formato tão singular de produção.

Toda essa peculiaridade pode ser vista no novo longa de Malick, “De Canção em Canção” ("Song to Song"), em exibição nos cinemas. O filme se passa em Austin, capital do Estado norte-americano do Texas. A trama traz os compositores BV (Ryan Gosling) e Faye (Rooney Mara) buscando um lugar ao sol. Quem abre as portas desse mundo para eles é Cook (Michael Fassbender), um magnata da música, o cara dos bastidores que faz as coisas acontecerem, que dá brilho às estrelas. Os três desenvolvem uma relação profissional e de amizade ao mesmo tempo, mas os conflitos chegam uma hora ou outra. Ainda mais quando a garçonete Rhonda (Natalie Portman) entra na história.

Estética

Assim como nas outras obras de Malick, "De Canção em Canção" tem diálogos incompletos, alguns bem despretensiosos. Expressões provocativas que, sozinhas, podem se tornar frases de efeito, como “qualquer experiência é melhor que nenhuma”. A câmera acompanhando o andar dos personagens, às vezes pelas costas, por outras de lado. A mudança constante de cenários, em cenas curtas. A música que começa em um instante e segue nos minutos seguintes, provocando um estranhamento, já que nem sempre se encaixam no ritmo dos acontecimentos. Há uma linha cronológica em andamento e, ainda sim, futuro e passado atravessam a narrativa sem o menor aviso prévio.

E nisso vem a relação de família, a amizade, e as paixões. O trabalho, a aceitação, a lealdade, o amor e as promessas. Loucuras, luxúria, ostentação e confissões contidas em pensamentos que a pessoa só diz a si mesma. Há questionamentos, arrependimento, dor, brincadeira de criança, decepção e vida que segue. É como se Malick tentasse traduzir toda complexidade da alma em imagens. Imagens que estão ali, tão nítidas, e que ainda assim a gente não consegue compreender. Como uma bela pintura expressionista, ou uma carta escrita em sumério. Há apenas uma sensação de encantamento, rara e difícil de descrever.

Atuações

Gosling é músico na vida real e se sente muito à vontade no filme. Rooney fala em silêncio, só com olhares e sorrisos. Os dois sobressaem, principalmente quando contracenam. Fassbender faz mais uma grande atuação de sua carreira. Natalie Portman aparece menos, mas não passa despercebida. Atua com precisão. O longa ainda se dá ao luxo de ter Cate Blanchett, Holly Hunter, Val Kilmer e a belíssima Bérénice Marlohe como coadjuvantes. Os músicos Patti Smith, Iggy Pop e Lykke Li também estão no elenco, assim como a banda Red Hot Chili Peppers e Johnny Rotten, vocalista do Sex Pistols, o que traz bastante realismo para a ambientação. E pra fazer jus ao título, a trilha sonora é muito bem acertada.

Sim ou não

O lado negativo do longa é a duração. Duas horas deixam a história entediante. Dá a impressão de que muita coisa poderia ficar de fora. Isso acontece em todo filme de Malick, é quase uma marca registrada. O ponto alto fica por conta da fotografia. Imagens com pouca cor, raios de sol bem capturados, em cenários lindíssimos. Mostra a beleza da cidade de Austin como nunca vista antes no cinema: casas luxuosas, cursos d’água, luzes, arranha-céus, e muita gente bonita. Há também passagens pelo México, não menos impressionantes. A soma de tudo isso é como um drink de Campari: lindo de se ver, difícil de descer. Ou você adora ou você odeia. Eu amei.



Ficha técnica:
Direção: Terrence Malick
Produção: FilmNation Entertainment / Waypoint Entertainment
Distribuição: Supo Mungam Films
Duração: 2h09
Gêneros: Drama / Romance / Musical
País: EUA
Classificação: 14 anos
Nota: 4 (0 a 5)

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25 julho 2017

Carregado de nonsense, "Perdidos em Paris" leva o público às gargalhadas com um humor ingênuo e terno

Comédia franco-belga pode ser conferida no Belas Artes e no Net Cineart Ponteio (Fotos: Potemkine Films/Divulgação)


Mirtes Helena Scalioni


Mesmo que pareça um pouco fora de moda, vale a pena ver "Perdidos em Paris" ("Paris Pieds Nus"), nem que seja para relembrar e homenagear um tempo de mais romances e maior leveza. Quase nada no filme tem a ver com a realidade e talvez resida aí seu encanto. Para completar, o longa escancara uma Paris - linda, como sempre - florida, iluminada e cheia de charme. Precisa mais?


Uma série de coincidências - nem todas racionalmente aceitáveis - provoca o encontro, em Paris, de Fiona (Fiona Gordon) e Dom (Dominique Abel). Ela é uma jovem meio tonta, que deixa uma estação glacial no Canadá, onde trabalha, para tentar socorrer uma velha tia que lhe escreve da Europa, pedindo socorro, pois querem levá-la para um asilo. Ele, um vagabundo morador de rua que vive de pequenos golpes. A partir daí, as estripulias se multiplicam em dezenas de tropeções, tombos e desencontros e o espectador vai aceitando, devagar, que está diante de um filme de palhaços - no melhor sentido que essa expressão possa ter.


Desengonçados, feios e trapalhões, Fiona e Dom - que são Fiona Gordon e Dominique Abel, diretores, roteiristas e produtores do longa - levam o público a altas gargalhadas. Se, no início, há um estranhamento pelo excesso de nonsense, aos poucos o espectador entra no ritmo do humor ingênuo que, em muitos momentos, lembra Charles Chaplin ou Jerry Lewis. Nesse quesito, é impagável a cena da caixa de som no barco restaurante, cuja retumbância coloca em uníssono os movimentos dos clientes nas mesas.


Impagável também é a cena da dança, com a câmara focalizando apenas os pés de Martha e Norman, ambos interpretados por artistas veteranos do cinema francês. Ela, para quem não se lembra, é a excepcional Emmanuelle Riva, que viveu Anne, protagonista de "L'Amour", papel pelo qual foi indicada ao Oscar em 2013. Riva morreu em janeiro deste ano. Ele é Pierre Richard, comediante muito conhecido na França.


Nesses tempos duros de violência e conflitos, um pouco de ingenuidade faz bem à mente e ao fígado. O público agradece e aplaude. Cinema do bem. Classificação: 12 anos



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