14 abril 2023

"O Colibri" aposta na narrativa simples para falar de memórias

Baseado no romance de Sandro Veronesi, filme segue a vida e as relações de um médico desde a década de 1970 (Fotos: Enrico De Luigi)


Marcos Tadeu 
Blog Narrativa Cinematográfica


Responsável por abrir o Festival de Roma e exibido no Festival de Toronto, o longa "O Colibri" estreia no UNA Cine Belas Artes, sob a direção de Francesca Archibugi. A obra é marcada pela simplicidade de sua narrativa ao falar do resgate das memórias e vivências de maneira intimista e intensa.


A história começa no início da década de 1970 e segue por vários anos da vida do protagonista. No longa, conhecemos Marco Carrera (Pierfrancesco Favino), um importante médico que é interrompido durante seu atendimento por um psicólogocom notícias sobre o estado de saúde de Luisa Lattes (Bérénice Bejo), um amor do passado que nunca foi consumado nem esquecido. 


Casado e vivendo em Roma com a esposa Marina (Kasia Smutniak) e a filha Adele (Benedetta Porcaroli), ele terá de confrontar suas escolhas do passado que podem afetar seu futuro. Mas será em Florença onde deverá passar por suas piores provações. 

O longa brinca com as questões de tempo, uma importante ferramenta na narrativa, mesmo que às vezes falte um maior contexto entre os acontecimentos.


Grande parte do público talvez julgue as atitudes de Marco. Ele é um cara que se casou apenas por fachada, e agora quer recuperar seu amor do passado. Tudo isso vai influenciar tanto a vida do protagonista quanto dos demais personagens.

O drama familiar é um ponto positivo que ajuda a segurar as mais de duas horas de duração do filme. Além de Marco temos os pais dele vivendo uma situação parecida. 


As atuações estão boas e nenhum personagem soa exagerado. Pelo contrário, todos estão no mesmo nível de entrega e isso faz com que a história ganhe ainda mais força.

Baseado no romance homônimo de Sandro Veronesi, "O Colibri" é uma produção italiana com muitas camadas sendo abordadas e uma boa conclusão. Vale o ingresso.


Ficha técnica:
Direção: Francesca Archibugi
Produção: Fandango; Rai Cinema, Les Films des Tournelles, Orange Studio
Distribuição: Pandora Filmes
Exibição: UNA Cine Belas Artes - sessões às 16 e 20h30
Duração: 2h06
Classificação: 14 anos
País: Itália
Gênero: drama

13 abril 2023

“O Lodo” promete encantar e instigar plateias Brasil afora

Estranho, forte, real, contundente e mágico, filme dirigido por Helvécio Ratton é baseado no conto homônimo de Murilo Rubião (Fotos: Bianca Aun e Lauro Escorel)


Mirtes Helena Scalioni


Que ninguém se engane. O filme “O Lodo”, baseado no conto homônimo de Murilo Rubião, que estreia nesta quinta-feira (13) em todo o Brasil, não tem nada de leve e divertido como pode parecer no início, quando muita gente ri da insistência meio pegajosa do psiquiatra Dr. Pink.

Ele quer, a todo custo, continuar cuidando do seu novo cliente Manfredo, já que ele, embora deprimido, desiste do tratamento na primeira sessão. 

A cena dos dois discutindo naquele consultório – um no divã e o outro de costas, no sofá – leva o público a inevitáveis risadas. Puro engano.


O grande mérito do filme dirigido pelo mineiro Helvécio Ratton talvez seja este: enlevar, quase enfeitiçar o público até transportá-lo, com destreza e maestria, para um outro lugar.

Devagar, o riso vai virando um sorriso amarelo e, bem aos poucos, uma espécie de desconforto vai sendo construído na cabeça e no corpo do espectador, que acaba atolado num lamaçal – lodo? - que mais parece uma areia movediça.

Roteiro, direção, iluminação, fotografia, edição, tudo parece ter sido minuciosamente pensado para quebrar as estruturas do público.


Dita assim, rasteiramente, a história poderia ser simplesmente resumida como: Manfredo, funcionário burocrático de uma empresa de seguros, anda se sentindo desanimado e procura um especialista com o objetivo de obter um remedinho e voltar à normalidade.

Só que, desde a primeira consulta, o Dr. Pink insiste, de maneira incisiva e autoritária, que seu cliente precisa de novas sessões para falar do passado e, só assim, se livrar do lodo interno que o corrói e adoece.


Quem conhece o escritor sabe que “O Lodo” é essencialmente Murilo Rubião, com seus absurdos concretamente reais, seus delírios solidamente palpáveis.

Sem nenhum estranhamento, o público do filme de Ratton assimila – e aceita – a mágica fantasia dos personagens e acontecimentos. De bom grado e com naturalidade, como se tudo aquilo fizesse parte da vida.

As atuações de “O Lodo” são um capítulo à parte, assim como o cenário, a região mais central de Belo Horizonte, com locais facilmente reconhecíveis por quem conhece a cidade.


Assim como a maioria do elenco, Eduardo Moreira, que interpreta magistralmente o protagonista, faz parte do Grupo Galpão. 

Ele entrega um Manfredo trabalhador, burocrático, solteiro convicto, paquerador e mulherengo, sem nenhuma disposição para remexer o passado, talvez por medo das próprias lembranças.

Renato Parara, outro ator experiente, faz com brilho o esquisitíssimo psiquiatra que passa a perseguir seu cliente tanto em pesadelos como na vida real.


Estão ainda no elenco, todos com atuações perfeitas e na medida, Teuda Bara como D. Sirlene, a dedicada empregada de Manfredo; Maria Clara Strambi e Inês Peixoto como Epsila, a irmã adolescente e depois adulta do protagonista; Rodolfo Vaz como Xavier, o colega de trabalho de caráter duvidoso; Thaís Mazzoni como a colega de trabalho gostosinha Ana.

Temos também Fernanda Vianna como a amante Laura; Samira Ávila como a sedutora secretária do Dr. Pink; Mário César Camargo (que nos deixou há pouco tempo), como o chefe da seguradora; e Claudio Márcio como o estranho menino que chega a Beagá com Epsila.


Também é preciso citar a fotografia ora onírica, ora real, de Lauro Escorel, e a participação de L.G Bayão como roteirista parceiro de Helvécio Ratton a partir do conto. 

Com facilidade, ao final, o público vai sair com a certeza de que o grupo foi cuidadosamente montado para que a magia do filme pudesse acontecer. Imperdível!


Ficha técnica:
Direção: Helvécio Ratton
Produção: Quimera Filmes
Distribuição: Cineart Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h34
Classificação: 14 anos
País: Brasil
Gênero: drama