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18 julho 2024

Minissérie “Ripley”, da Netflix, nos dá o direito de torcer pelo vilão

Andrew Scott interpreta o protagonista que vive de aplicar golpes, mas também tem um passado sombrio
(Fotos Netflix)


Jean Piter Miranda


Para quem gosta de torcer pelo vilão, está disponível na Netflix a minissérie “Ripley”. A obra tem como protagonista Tom Ripley (Andrew Scott), um homem que vive de aplicar pequenos golpes na Nova York dos anos 1960. Ele é recrutado por um empresário muito rico para uma missão: viajar para a Itália e convencer o filho desse milionário a voltar para casa. 

Tom aceita. Além de ter todas as despesas pagas para passear pelo país europeu, a proposta inclui um bom pagamento em dinheiro. Nesse cenário, ele vê uma ótima oportunidade de ter ganhos ainda maiores. 


O filho do milionário é Dickie Greenleaf (Johnny Flynn), que vive na pequena e bela cidade de Atrani, no sul da Itália. Ele passa os dias com a namorada Marge Sherwood (Dakota Fanning), em uma rotina de muita tranquilidade. Entretanto, tudo muda com a chegada de Tom. 

Ao longo da trama, o golpista contratado usa mentiras e mais mentiras, se comportando como uma pessoa sensata, calma e centrada. Faz encenações e consegue disfarçar muito bem a pessoa fria, cruel, manipuladora e calculista que realmente é. Assim, aos poucos, se aproxima de Dickie e vai ganhando a confiança do jovem. Isso enquanto sua presença incomoda cada vez mais a bela Marge. 


A minissérie tem apenas oito capítulos e um poder enorme de prender a atenção do espectador. É um suspense psicológico. A dúvida é saber se Tom vai ser pego nessa vez ou na próxima. Ele parece ter sempre uma carta na manga e estar um passo à frente. Mesmo assim, a todo o momento fica a dúvida se deixou pistas, rastros, vestígios e como vai reagir se for pego de surpresa. 

Em um determinado momento, a obra vira uma trama policial. Investigação, corrida de gato e rato, sem deixar o suspense de lado.E no meio disso tudo, é supernormal torcer pelo vilão só pra ver onde tudo vai dar. 


Os oito capítulos são todos em preto e branco, o que deixa a ambientação ainda mais perfeita. As roupas, os carros, os cenários, tudo é feito com muito cuidado. Reproduzem com perfeição os anos 1960. Andrew Scott está impecável. Dakota Fanning também tem muita presença. Johnny Flynn destoa e entrega atuação bem sem graça. 

Coco Sumner, cantor e ator britânico, interpreta Freddie Miles de forma brilhante. Um personagem muito chato e bem arrogante que, quando está em tela, rouba as atenções. 

O elenco ainda é composto por vários atores italianos, falando o idioma local, o que traz um realismo ainda maior à minissérie. Não é como aqueles filmes em que todo mundo, convenientemente, fala inglês fluente onde quer que esteja. É um detalhe que faz muita diferença. 


Vale destacar que, mesmo com imagens monocromáticas, os cenários são lindos. Veneza, Nápoles, Roma e Sicília. Igrejas, esculturas, obras de artes, casarões, praias, paisagens, viagens de trem. Uma riqueza cultural sem tamanho. Dá muita vontade de viajar pela Itália. 

E para deixar a obra ainda mais rica, a trama amarra bem a história de Tom com a do grande pintor Caravaggio. É uma minissérie para maratonar e contemplar. 

Música

A trilha sonora está simplesmente perfeita. Não há outra forma de descrever o trabalho de Jeff Russo. Canções que podem ser ouvidas clicando nesta playlist


Adaptação

“Ripley” é baseado no livro “O Talentoso Ripley”, de Patricia Highsmith. A direção é do armênio-americano Steven Zaillian, que atuou como roteirista de grandes produções como “O Irlândês” (2019), “Millennium - Os Homens Que Não Amavam as Mulheres” (2011) e “Gangues de Nova York” (2002). 

A obra, de 1955, considerada um clássico da literatura policial,já foi adaptada para o cinema em “O Sol por Testemunha” (1960), com Alain Delon como protagonista. 

Em 1999, outra versão foi lançada, mantendo o título original: “O Talentoso Ripley”. O filme tem Matt Damon como Ripley, Jude Law e Gwyneth Paltrow formando o casal Dickie e Marge, com a ótima direção de Anthony Minghella.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Steven Zaillian
Produção: Netflix e Filmrights
Exibição: Netflix
Duração: 8 episódios
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: drama, suspense, policial
Nota: 4,5 (0 a 5)

15 julho 2024

“O Sequestro do Papa” busca fato do passado para falar de fundamentalismo e intolerância religiosa

Atual e sensível, filme é baseado em uma história verídica que chocou a Itália no século XIX
(Fotos: Pandora Filmes)


Mirtes Helena Scalioni


Que ninguém se engane. Embora o título possa induzir, “O Sequestro do Papa” ("Rapito") não é uma comédia. Ao contrário, trata-se de um filme denso, sério, questionador e, acima de tudo, atual. 

Com uma reconstituição perfeita do século XIX, conta a história do garoto Edgardo Mortara, que, aos seis anos, foi raptado de sua casa em Bolonha, para ser criado num seminário em Roma. O longa entra em cartaz nos cinemas nesta quinta-feira (18).


Com muita coragem e um elenco afiado, o diretor Marco Bellocchio coloca o dedo na ferida, relembrando um tempo em que Estado e religião se misturavam. 

Na época em que se passa o filme, em 1858, a Itália era comandada com mãos de ferro por Pio IX e, apesar da carolice, faltava compaixão e sobrava a arrogância típica dos donos da verdade.


No auge da autoridade do Papado, a família judia de Momolo Mortara é surpreendida um dia com a chegada dos agentes do Estado/Igreja para levar Edgardo, um de seus oito filhos. 

O menino é retirado à força dos braços dos pais em cumprimento a uma denúncia de que ele havia sido batizado. De acordo com a lei vigente, cristãos não podiam ser criados por judeus pagãos.


A partir desse sequestro, o espectador acompanha a luta de Marianna e Momolo Mortara para reaver o filho, enfrentando viagens a Roma, humilhações e processos até o julgamento do caso, em 1860. A história deles revela um capítulo sombrio da tirania histórica na Igreja tendo como pano de fundo uma nação à beira da revolução. 

Cabe ressaltar a atuação, convincente e comovente, do menino Enea Sala como Edgardo. Aliás, todo o elenco merece aplausos: Leonardo Maltese como Edgardo adulto, Paolo Pierobon como o arrogante Papa Pio IX, Filippo Timi como o cardeal Giacomo Antonelli, Fabrizio Gifuni como o advogado Jussi, Anna Morisi como a babá, Bárbara Ronchi como a mãe Marianna Padovani, Fausto Russo Alesi como Momolo Mortara e outros.


Enfim, “O Sequestro do Papa” é, antes de tudo, um filme político como outros de Marco Bellocchio, que antes dirigiu, por exemplo, “Bom Dia, Noite” (2003).

O longa tem tudo para prender a atenção do público e é uma ótima oportunidade de reflexão para esses tempos de moralismo, lavagem cerebral, intolerância religiosa, investidas fundamentalistas e perigosas misturas de religião e Estado.


Ficha técnica:
Direção: Marco Bellocchio
Distribuição: Pandora Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h14
Classificação: 12 anos
Países: Itália, França, Alemanha
Gêneros: drama, história

02 julho 2024

"A Flor do Buriti": ode ao povo Krahô e à resistência indígena

Fotografia alterna entre planos abertos e detalhes, revelando o cotidiano e os diálogos de uma vivência indígena (Fotos: Renée Messora)


Silvana Monteiro


Uma produção feita por três nações. Este é o longa "A Flor do Buriti", distribuído pela Embaúba Filmes, que entra em cartaz nesta quinta-feira (4), no Centro Cultural Unimed BH-Minas. O roteiro é assinado pelo português João Salaviza, pela brasileira Renée Nader Messora e pelos integrantes do povo Krahô - Ilda Patpro Krahô, Francisco Hyjnõ Krahô e Henrique Ihjãc Krahô.

Produzido por Julia Alves e Ricardo Alves Jr., da produtora mineira Entre Filmes, a história oferece uma visão documental e holística da vida dos Krahô. O documentário foi filmado durante 15 meses em quatro aldeias diferentes, dentro da terra indígena Kraholândia.


A fotografia alterna entre planos abertos, e planos detalhe, que revelam o cotidiano e os diálogos autênticos de uma vivência indígena. Essa abordagem cinematográfica consegue traduzir o sentimento de um povo cuja história esteve à beira da extinção.

O pajé e os demais parentes do povo Krahô realizam um ritual entoando um cântico à flor do buritizeiro. Curumins com flechas tentam proteger a mata e a aldeia. A menina Jotat é perturbada em seus sonhos por espíritos. 


Sempre vigilante, a curumim que habita o território Pedra Branca, na Kraholândia, norte de Tocantins, preocupa-se com a chegada dos cupé (invasores) à sua terra. Lapsos da memória ancestral marcada pela violência dos fazendeiros criadores de gado.

São cenas das crianças que se misturam à natureza, das mulheres trabalhando o artesanato nos capinzais, da arte marcada no rosto. Da busca pela proteção das aves, do velho índio em confronto para guardar seu povo e das conversas que revelam não só histórias mitológicas, mas também uma vida de luta pela sobrevivência. Todas enriquecem a obra e nos dão a sensação de estarmos ali, aldeados junto a eles.


As sombras do passado ainda assombram os Krahô. Enquanto uma mulher está prestes a dar à luz, seu marido vigia a porteira do território para impedir a expropriação dos bens naturais de seu povo. 

Simultaneamente, uma jovem envolvida em movimentos sociais se prepara para viajar a Brasília, onde participará da Mobilização Nacional dos Povos Indígenas ao lado da líder Sônia Guajajara, hoje Ministra dos Povos Indígenas.

"A Flor do Buriti" atravessa os últimos 80 anos dos Krahô, trazendo para a tela memorias e relatos de um massacre ocorrido em 1940, onde morreram dezenas de pessoas. Perpetrado por dois fazendeiros da região, as violências praticadas naquele momento continuam a despertare o espírito  guerreiro desse povo.


"A Flor do Buriti" é um retrato sincero da resiliência e da espiritualidade dos Krahô, celebrando a sua cultura e resistência diante das adversidades. É uma história que ressoa com força e urgência, convidando o espectador a uma profunda reflexão sobre a importância da preservação da cultura dos povos originários.

Premiações

Exibido em mais de 100 festivais ao redor do mundo, o filme recebeu o prêmio coletivo para melhor elenco na mostra Un Certain Regard, do Festival de Cannes. Também foi vencedor em 14 outros importantes festivais, como o de Munique (Cinevision Award), Lima (Prêmio Signis), Mar del Plata (Prêmio Apima Melhor filme Latino-Americano), Festival dei Popoli (Melhor Filme), Huelva (Prêmio Especial do Júri e Prêmio Melhor Filme Casa Iberoamérica), RIDM Montreal (Prêmio Especial do Júri), Biarritz, Viennale, e Forumdoc.BH.


Ficha técnica
Direção:
João Salaviza e Renée Nader Messora
Roteiro: João Salaviza, Renée Nader Messora, Ilda Patpro Krahô, Francisco Hyjnõ Krahô, Henrique Ihjãc Krahô
Produção: Entre Filmes
Distribuição: Embaúba Filmes
Exibição: Centro Cultural Unimed BH - Minas
Duração: 2h04
Classificação: 14 anos
Países: Brasil e Portugal
Gêneros: documentário, drama

01 julho 2024

Cine Theatro Brasil Vallourec exibe mostra especial de cinema em julho a preços populares

Seleção traz temáticas variadas, com duas sessões a cada segunda-feira (Fotos: Divulgação)


Da Redação


A edição de julho do projeto “Segunda no Cine” trará aos espectadores uma programação especial extensa de férias dentro da Mostra de Cinema Cine Theatro Brasil Vallourec. Serão exibidos dois filmes, todas as segundas-feiras, às 16h e às 19h30, com uma abordagem bem nostálgica. A produção é de Camila Lana e todas as exibições terão audiodescrição e estrutura para cadeirantes. 

A programação foi dividida em quatro temáticas: Diferentes modos de dizer “Era Uma Vez”; A Poética da Juventude; Pelo Olhar de John Hughes e Entender o Mundo Através dos Afetos. Entre os longas a serem apresentados estão clássicos como "Branca de Neve e os Sete Anões" (1937), "Curtindo a Vida Adoidado" (1986), "Os Incompreendidos" (1959), "Sociedade dos Poetas Mortos" (1989), dentre outros. 

"Sociedade dos Poetas Mortos"

As exibições acontecem no Teatro Câmara, com ingressos populares a R$ 10,00 a inteira e R$ 5,00 a meia. Ao final de cada exibição, um especialista ou cinéfilo convidado participa de uma sessão comentada e abre uma conversa com o público sobre aspectos temáticos e estilísticos referentes ao filme que acabaram de ver. 

De acordo com o curador do projeto "Segunda no Cine", Rodrigo Azevedo, são histórias que atravessam gerações. “São crônicas estéticas que nos conduzem a uma compreensão mais profunda das tensões e evoluções que moldam a percepção e os desafios do que é amadurecer no mundo que nos envolve”. 

"Conta Comigo"

Confira a programação completa:

01/07 - Sessão de abertura
19h - "Conta Comigo" ("Stand By Me") - 1986 (Rob Reiner)

08/07 - Temática: Diferentes modos de dizer “Era Uma Vez”
16h - "Branca de Neve e os Sete Anões" - ("Snow White and the Seven Dwarfs") - 1937 (William Cottrell, David Hand e Wilfred Jackson)
19h30 - "Moonrise Kingdom" - 2012 (Wes Anderson)

"Branca de Neve e os Sete Anões"

15/07 - Temática: A Poética da Juventude
16h - "Os Incompreendidos" - ("Les Quatre Cents Coups") - 1959 (François Truffaut)
19h30 - "As Vantagens de Ser Invisível" ("The Perks of Being a Wallflower") - 2012 (Stephen Chbosky)

22/07 - Temática: Pelo Olhar de John Hughes
16h - "Clube dos Cinco" ("The Breakfast Club") - 1985 (John Hughes)
19h30 - "Curtindo A Vida Adoidado" ("Ferris Bueller's Day Off") - 1986 (John Hughes)

29/07 - Temática: Entender o Mundo Através dos Afetos
16h - "Sociedade dos Poetas Mortos" ("Dead Poets Society") - 1989 (Peter Weir)
19h30 - "Hoje Eu Quero Voltar Sozinho" - 2014 (Daniel Ribeiro)


"Hoje eu Quero Voltar Sozinho"

Serviço:
Ingressos:
R$ 10,00 (inteira) e R$ 5,00 (meia)
Bilheteria: Av. Amazonas, 315 – Centro
Funcionamento: Seg – Sáb: 12:00 – 21:00 e Dom e feriados: 15:00 – 20:00. Horário especial nos feriados
Telefones: (31) 3201.5211 ou (31) 3243.1964
Informações:
https://www.cinetheatrobrasil.com.br/

27 junho 2024

Lento e arrastado, “Salamandra” é confuso, mal contado e não prende o espectador

Drama estrelado pela atriz francesa Marina Foïs e o brasileiro Maicon Rodrigues se passa em Olinda e Recife (Fotos: Pandora Filmes)


Mirtes Helena Scalioni


É possível arriscar que apenas as pessoas que leram o romance do mesmo nome são capazes de entender – e gostar – do filme “Salamandra”, primeiro longa do diretor Alex Carvalho, que estreia no Centro Cultural Unimed BH - Minas. 

A começar pelo lugar onde se passa a história, nada é muito claro no drama estrelado pela atriz francesa Marina Foïs. Não fosse o apoio da Secretaria de Cultura de Pernambuco explícito no início da projeção, o que leva o espectador a deduzir que tudo acontece em Olinda e Recife, sequer a locação estaria clara.


A sinopse do filme, baseado no romance "La Salamandre", de Jean-Christophe Rufin, diz que a história trata da vinda de Catherine (Marina Foïs) para o Brasil, após a morte do pai. 

Aqui, ela pretenderia se reconectar com a irmã, vivida por Anna Mouglalis e casada com Ricardo (Bruno Garcia). Mas logo nos primeiros dias se apaixona pelo jovem Gilberto, interpretado por Maicon Rodrigues, apesar de todas as censuras e desigualdades entre os dois.


A começar pelo título, “Salamandra” deixa muitas pontas soltas, levando o espectador a um verdadeiro jogo de adivinhação. Aos poucos, vai-se descobrindo que o jovem negro Gilberto é uma espécie de rato de praia, vivendo de pequenos trambiques. 

Mas nada abala a paixão da francesa, que se entrega ao romance, apesar das diferenças entre eles. Quem se interessar em pesquisar, vai descobrir que salamandra é um anfíbio semelhante a um lagarto, cuja imagem é associada ao fogo e, com algum esforço, à paixão.


Com duração de cerca de quase duas horas, o filme se arrasta em cenas longas e lentas, inclusive as de sexo entre Catherine e Gil, evidenciando a diferença dos corpos e da cor da pele dos dois. Os demais atores, como Bruno Garcia, Attan Souza Lima (como Pachá, ex-patrão de Gil) e outros, apenas gravitam em torno dos dois protagonistas sem interferência ou vida própria.

Com alguma boa vontade, é possível enxergar algum discurso antirracista e até alguma referência às desigualdades sociais e aos relacionamentos em que a mulher é mais velha do que o homem. Mas é preciso muita boa vontade para gostar de uma história tão mal contada, tão sem pé nem cabeça. Haja paciência pra buscar significados e metáforas.


Ficha técnica
Direção e roteiro:
Alex Carvalho
Produção: NFilmes, Cinenovo, Scope Pictures, coprodução Canal Brasil e Telecine
Distribuição: Pandora Filmes
Exibição: Centro Cultural Unimed BH - Minas, sala 2, sessão 20h10, somente nos dias 27 e 30 de junho e 2 de julho
Duração: 1h56
Classificação: 18 anos
Países: Brasil, França, Alemanha e Bélgica
Gênero: drama

23 junho 2024

“Clube dos Vândalos” trata da formação de um clube (ou gangue) de motociclistas

Baseado em livro, filme mostra recorte de alguns anos da vida de integrantes de motoclube no final dos anos 1960 (Fotos: Universal Pictures)


Eduardo Jr.


Dirigido por Jeff Nichols e distribuído pela Universal, “Clube dos Vândalos” ("The Bikeriders") está entre os lançamentos polêmicos em cartaz no cinema. O longa fala do surgimento e transformação de um grupo de motociclistas americanos. 

Permeado por drama e romance, o filme se inspira em um livro de Danny Lyon, que acompanhou por quase uma década um motoclube, fotografando e entrevistando os integrantes. 

A história, ambientada nos anos de 1960, começa dando a entender que será dividida em atos, tendo como ponto de partida o relato de Kathy (Jodie Comer), a jovem que se apaixonou pelo protagonista Benny (Austin Butler) e viveu boa parte da existência d’os “Vândalos”. 


Mas apenas ela atua como narradora. Outros pontos de vista ficam de fora (exceto por umas poucas cenas dos atores sendo entrevistados por Danny (papel de Mike Faist). 

A proposta de aventuras, motociclistas encrenqueiros, e romance está lá, no cartão de visitas do longa. Benny é apresentado como um desajustado, mas a beleza do garotão encanta Kathy. Com a promessa de Johnny, o fundador dos Vândalos (personagem do ótimo Tom Hardy), de que ela não terá problemas ali, ela embarca no romance, conforme conta em sua entrevista. 


Se a direção acerta ao conduzir a história por um ponto de vista feminino, num grupo ultra masculinizado, e ao expressar a liberdade sobre duas rodas e o senso de pertencimento daqueles homens, derrapa em outros pontos. 

O papel do entrevistador quase desaparece. Mike Faist fica ali, em alguns momentos, segurando um microfone e fazendo poucas perguntas. Perde-se a chance de explorar mais das histórias e perfis que essas entrevistas podem ter captado. 


Gradualmente o espectador vai conhecendo mais sobre as regras daquele grupo. E até sobre a formação de uma masculinidade que deixa marcas. Mas, da metade do filme em diante, a motocicleta vai descendo a ladeira. Vai se criando tal visão daqueles motoqueiros que é difícil imaginar que os adeptos da cultura do motociclismo venham a se sentir representados por essa obra. 

O drama da ampliação do grupo, da chegada de novos membros, do posicionamento dos integrantes diante da transformação do grupo e da sociedade criam um retrato que tira o brilho dos personagens e da história do grupo. 

Na plateia da sala Cineart, o público se dividia. Alguns expressavam satisfação enquanto outros saíam descontentes. Vá ao cinema e tire suas conclusões - e não saia da sala antes dos créditos finais, as fotos originais da época podem agradar.  


Ficha Técnica:
Direção: Jeff Nichols
Produção: Universal Pictures, New Regency, Tri-State Pictures
Distribuição: Universal Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h55
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gênero: drama

13 junho 2024

“A Ordem do Tempo” questiona o fluxo da vida e a fragilidade da existência

Obra é inspirada no best-seller homônimo do físico especialista em mecânica quântica, Carlo Rovelli, sobre o fim do mundo (Fotos: Pandora Filmes) 


Silvana Monteiro

Imagine se durante uma celebração entre amigos você descobrisse que o mundo estaria prestes a acabar. Este é o drama italiano "A Ordem do Tempo" (“L’Ordine Del Tempo”), que chega ao Cineart Ponteio, ao Centro Cultural Unimed-BH Minas e ao Una Cine Belas Artes nesta quinta-feira (13). Amigos inseparáveis, que adoram comemorar a beleza e os momentos marcantes da vida, se vêem diante desse dilema. 


A obra, distribuída pela Pandora Filmes, traz uma instigante narrativa inspirada no best-seller de mesmo nome do físico-teórico Carlo Rovelli. Dirigido pela veterana cineasta italiana Liliana Cavani, em colaboração com o roteirista Paolo Costella, o filme apresenta uma perspectiva profunda e intimista sobre a percepção humana de como o tempo é implacável. O tempo é fluxo contínuo? Ele se dá de forma cronológica? Os fatos do presente, passado e futuro estão conexões? E como lidar com ele?


Um dos grandes destaques de "A Ordem do Tempo" é a forma como a autora transmite a temporalidade dos acontecimentos na percepção dos personagens, ora prestes a acabar, ora distante e tenso. Cavani finalizou o longa em 2023, ao completar 90 anos.

A direção de Cavani, reconhecida por seu olhar atento aos dramas humanos, conduz a narrativa com um ritmo pausado e uma atmosfera de tensão latente, permitindo que o público se engaje profundamente com as questões levantadas. 


Entre os sucessos de sua carreira está o polêmico filme "O Porteiro da Noite" (1974), que retrata a relação sadomasoquista entre um ex-oficial de um campo de concentração nazista e uma de suas prisioneiras. 

No elenco, ela conta com a atuação de Alessandro Gassmann, Claudia Gerini, Edoardo Leo, Kseniya Rappoport, Richard Sammel, Valentina Cervi, Francesca Inaudi, Angeliqa Devi, Mariana Tamayo, Fabrizio Rongione, Ángela Molina e Alida Baldari Calabria. 

Ao longo da trama, os amigos e seus cônjuges começam a tecer suposições e a revelar verdades, indagações, emoções e sentimentos guardados. Essa dinâmica de interações e conflitos internos cria um retrato vívido da forma como as pessoas lidam com a iminência do fim.


A atuação é destacada, com os intérpretes conseguindo transmitir a gama de emoções e dilemas experimentados por seus personagens. A construção cuidadosa dos diálogos e a ambientação elegante contribuem para criação de um drama intimista e reflexivo.

Longe de cair em sensacionalismos ou efeitos dramáticos excessivos, o filme mantém uma abordagem contemplativa e introspectiva, explorando as complexidades da percepção do tempo e suas implicações existenciais. 

"A Ordem do Tempo" é um filme que transcende o mero entretenimento, convidando o espectador a refletir sobre a natureza do tempo, a fragilidade da existência e a busca por significado em face da finitude. Uma obra cinematográfica instigante e merecedora de atenção.


Ficha Técnica:
Direção: Liliana Cavani
Roteiro: Liliana Cavani e Paolo Costella, a partir do livro de Carlo Rovelli
Distribuição: Pandora Filmes
Exibição: sala 3 do Cineart Ponteio - sessão de 21h05; sala 2 do Centro Cultural Unimed-BH Minas - sessão às 20h30; sala 2 do Una Cine Belas Artes - sessão às 18h20
Duração: 1h53
Classificação: 14 anos
País: Itália
Gênero: drama

06 junho 2024

"Grande Sertão" não perde em nada para produções hollywoodianas

Luísa Arraes e Caio Blat interpretam Diadorim e Riobaldo, os protagonistas na adaptação da obra literária de Guimarães Rosa (Foto: Helena Barreto)


Larissa Figueiredo 


Com ares de distopia cyberpunk, o filme "Grande Sertão", de Guel Arraes, estreia nos cinemas nesta quinta-feira (6). Adaptação do romance homônimo de Guimarães Rosa, "Grande Sertão: Veredas”, a produção é protagonizada por Luísa Arraes, como Diadorim, e Caio Blat, na pele de Riobaldo. 

O tempo da narrativa oscila entre o passado e o presente de Riobaldo. O roteiro e a montagem preservam as divagações do protagonista sobre o certo e o errado, Deus e o diabo, amor e ódio, e todas as dicotomias que moldam o desenrolar da história. 

Foto: Ricardo Brajterman/Divulgação

É nessas cenas que Blat “encarna” o jagunço, ora louco, ora lúcido, e mostra um total domínio do texto dinâmico, melódico e lírico, assim como na obra literária. 

Já Luisa Arraes, em sua primeira vez sendo dirigida pelo pai, não soou natural como Blat ao adentrar o universo da obra. A complexa personagem Diadorim é a força motriz do enredo e demanda uma profundidade que Arraes não correspondeu, entregando uma performance carregada de artificialidade. 

Intencionalmente ou não, a atriz também atribuiu à personagem trejeitos cômicos e exagerados que decepcionam o público que conheceu Diadorim no romance literário de Guimarães Rosa. 

Foto: Paris Filmes/Divulgação

A interpretação de Eduardo Sterblitch é uma das grandes surpresas do longa de Arraes. O ator e humorista encarou o desafio de trazer Hermógenes às telas. O personagem impiedoso e sinistro que tem pacto com o diabo ganhou um carisma assustadoramente único. Em "Grande Sertão", ele mostra sua genialidade e prova ao grande público sua versatilidade. 

A história se passa numa grande comunidade da periferia brasileira chamada “Grande Sertão”. A luta entre policiais e bandidos assume ares de guerra e traz à tona questões como lealdade, vida e morte, amor e coragem, Deus e o diabo. 

Riobaldo entra para o crime por amor a Diadorim, mas não tem coragem de revelar sua paixão. A identidade de Diadorim é um mistério constante para Riobaldo, que lida com escolhas morais e dilemas éticos, enquanto busca entender seu lugar no mundo e sua própria natureza. 

Foto: Helena Barreto/Divulgação

De forma geral, além do texto lírico, a obra remonta às origens do cinema e traz forte contribuição do teatro. Todos os personagens são hiperbólicos em seus movimentos, falas e expressões. 

O cenário de "Grande Sertão", que na adaptação é uma favela, não perde em nada para produções hollywoodianas, assim como a fotografia e a montagem, altamente coerentes esteticamente com a proposta da adaptação. 

Foto: Helena Barreto/Divulgação

As cenas de ação são extensas na medida certa entre o extraordinário e cansativo, mas bem coreografadas. Elas abordam com profundidade a estrutura das milícias nas comunidades e a retroalimentação do ciclo da violência na “luta” entre bandidos e policiais. 

"Grande Sertão" veio em boa hora. A adaptação é fiel ao livro e renova as discussões elaboradas por Guimarães Rosa em 1956. Por fim, é inegável dizer que o filme pode cativar tanto o público que leu o romance, quanto o que não conhece a obra. 


Ficha técnica:
Direção: Guel Arraes
Roteiro: Guel Arraes e Jorge Furtado
Produção: Paranoid Filmes, coprodução Globo Filmes
Distribuição: Paris Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h48
Classificação: 18 anos
País: Brasil
Gêneros: ação, drama
Nota: 4 (0 a 5)

29 maio 2024

“A Filha do Palhaço” - longa explora a afetividade parental entre artistas itinerantes e seus filhos

O drama explora a troca afetiva em que, tanto Joana quanto Renato precisam superar seus preconceitos e traumas do passado para se curarem (Fotos: Embaúba Filmes)


Silvana Monteiro


Filiação e paternidade, convivência familiar, relação entre gerações distintas, conflitos familiares, teatro, arte e transformações artística e humanossocial são temas retratados nesta obra de 2022, que estreia nesta quinta-feira (30), mas que já pode ser conferida na pré-estreia de hoje no Centro Cultural Unimed-BH Minas.

Com produção da Marrevolto Filmes, em associação com a Pique-Bandeira Filmes, e distribuição pela Embaúba Filmes, "A Filha do Palhaço" conquistou o prêmio principal na Mostra de Cinema de Gostoso, além de receber o prêmio do público na Mostra de Tiradentes. 

A narrativa vai muito além do contexto superficial sobre a distância entre um pai comediante e sua filha adolescente. Ao invés disso, o diretor Pedro Diógenes nos apresenta uma história profundamente conflituosa e emotiva, mergulhando nas camadas complexas da afetividade parental e da identidade artística.


O ponto de partida é a relação tensa entre Joana e seu pai, Renato, que só aparece em datas comemorativas.  Essa ausência constante cria uma ferida emocional em Joana, que luta para entender o pai e sua dedicação à carreira como Silvenelly, um personagem cômico inspirado em um ícone da cultura local. 

Conforme o filme avança, vemos os conflitos se transformarem em afeto entre pai e filha. Joana inicialmente encara o trabalho do pai como uma fuga, uma máscara que o impede de se conectar com ela de verdade. Mas à medida que ela acompanha os shows de Silvenelly, seu olhar se desnuda. Ela percebe que aquele trabalho é uma forma de expressão artística e pessoal para Renato, ainda que envolva sacrifícios e até mesmo violência verbal.

O núcleo dramático do filme reside na troca afetiva, em que tanto Joana quanto Renato precisam superar seus preconceitos e traumas do passado para finalmente se curarem. Enquanto Joana aprende a valorizar o ofício do pai, Renato faz descobertas incríveis sobre suas identidades artística e pessoal, ressignificando sua autopercepção.


Essa afetividade conflituosa é magistralmente retratada por Demick Lopes (Silvenelly, personagem inspirada em Raimundinha de Paulo Diógenes) e Lis Sutter (Joana). Lopes transita com maestria entre os dois lados de Renato - o homem deprimido e inseguro, e o artista confiante e cômico. 

Já Sutter entrega uma estreia avassaladora como Joana, capaz de transmitir toda a dor e a esperança da personagem. Além deles, estão no elenco grandes artistas como Jesuíta Barbosa, Jupyra Carvalho, Ana Luiza Rios, Valéria Vitoriano e outros talentos.

Também a produção de "A Filha do Palhaço" é igualmente impressionante. A recriação dos shows de Silvenelly, com seus figurinos, maquiagens e sotaques característicos, nos transporta diretamente para o universo daquele artista. E a evolução visual de Joana, de uma adolescente ressentida a uma jovem mais madura, espelha perfeitamente seu crescimento emocional.


O detalhe importante de Silvenelly é ser um personagem similar a Raimundinha, famoso ícone do humor cearense criado por Paulo Diógenes, primo de Pedro, falecido em 14 de fevereiro de 2024. Por isso, a distribuição da obra aos cinemas, também se apresenta como uma homenagem póstuma ao artista.

Com um estilo que mescla circo e stand-up, Silvenelly faz piadas sobre o cotidiano local, arrancando risadas e muitas vezes enfrentando a violência da homofobia. "A Filha do Palhaço" aborda seus temas de forma sensível e corajosa, em uma construção, ora tensa, ora cômica, capaz de provocar momentos de reflexão, mas também de tirar gargalhadas de quem o assiste. 

O longa transcende o simples retrato de uma relação pai-filha. Pedro Diógenes nos convida a mergulhar em uma teia de emoções e conflitos, onde a aceitação, a identidade e a importância da conexão afetiva se entrelaçam de forma profunda e emocionante. Um filme obrigatório para quem busca cinema de qualidade e narrativas complexas.


Ficha técnica:
Direção: Pedro Diogenes
Produção: Marrevolto Filmes, em associação com a Pique-Bandeira Filmes
Distribuição: Embaúba Filmes
Exibição: Centro Cultural Unimed-BH Minas - sala 1 (sessão às 18h10) e sala 2 (sessão 18h20)
Duração: 1h44
Classificação: 16 anos
País: Brasil
Gênero: drama

15 maio 2024

Incômodo e indigesto, “A Hora da Estrela” está de volta para reforçar a complexidade de Clarice Lispector

Produção de 1985, protagonizada por Marcélia Cartaxo, retorna ao cinema em versão digitalizada, dentro do projeto Sessão Vitrine Petrobras (Fotos: Vitrine Filmes)


Mirtes Helena Scalioni


Embora muitos considerem impossível, a diretora Suzana Amaral foi lá e fez: transformou em cinema a obra complexa de Clarice Lispector em1985, quando, sob sua direção, “A Hora da Estrela” ganhou quase todos os prêmios do Festival de Brasília, além de ter conquistado o Urso de Prata de Melhor Atriz no Festival de Berlim. 

Pois agora o longa volta ao cartaz nos cinemas a partir desta quinta-feira (16), dentro do projeto Sessão Vitrine Petrobras, que está digitalizando e remasterizando películas importantes do cinema nacional. Ele pode ser conferido na sala 3 do Cine Una Belas Artes, sessão de 18h40, com ingressos a R$ 20,00 a inteira e R$ 10,00 a meia.


Não se pode dizer que o filme estrelado magnificamente por Marcélia Cartaxo seja fácil de ver. Não é. O longa, que conta a história de Macabéa, é indigesto e incomoda. 

Causa desconforto e talvez até certa repulsa a trajetória da nordestina de 19 anos que se vê absolutamente sozinha e despreparada numa cidade como São Paulo. Órfã de pai e mãe, desajeitada, ignorante, feia e ingênua, a jovem é mais uma figura invisível na metrópole.


Sem desmerecer o elenco, todo ele correto na medida, Marcélia Cartaxo é a grande responsável pelo brilho do filme. Sua Macabéa, tão tímida quanto estúpida, é quase uma provocação ao espectador com seus silêncios, olhares e posturas submissas. É como se ela pedisse desculpas por existir. 

Seu contraponto é o namorado Olímpico de Jesus, em atuação excelente de José Dumont, com suas tiradas professorais e engraçadas que, no entanto, não fazem o espectador rir.

É preciso ressaltar também a presença da sempre brilhante Fernanda Montenegro como a cartomante picareta Madame Carlota, responsável pela grande mudança na vida de Macabéa que, acreditando em suas previsões, pode ter finalmente a sua hora de estrela. Ao final, pode-se dizer, ninguém sai ileso do filme de Suzana Amaral.


Para quem não leu o livro de Clarice Lispector, vale contar que Macabéa divide um quarto com mais três moças e trabalha como datilógrafa numa firma onde tem como chefes os senhores Pereira e Raimundo, feitos por Denoy de Oliveira e Umberto Magnani. 

Entre as colegas, destaca-se a atirada e sensual Glória (Tamara Taxman), tão bonita quanto antiética. É nesses dois ambientes, além das praças, metrôs e ruas pelas quais transita, que essa heroína brasileira mostra, com sutileza, sua dor de viver.


Ficha Técnica
Direção: Suzana Amaral
Roteiro: Suzana Amaral e Alfredo Oroz
Baseado no romance homônimo de Clarice Lispector
Produção: Raiz Produções e Assunção Hernandes
Distribuição: Sessão Vitrine Petrobras e Vitrine Filmes
País: Brasil
Ano: 1985
Duração: 1h36
Classificação: 12 anos
Gênero: drama