Curta com direção de Sérgio Cunha e produção de Flávia Flores se apoia na história da “Loira do Bonfim” (Fotos: Reprodução/Youtube) |
Eduardo Jr.
Uma lenda urbana, conhecida por boa parte dos moradores de
Belo Horizonte, agora encontra representação no curta-metragem “Grades Invisíveis
- Ela Ainda Está Aqui”, que estreou no Youtube.
Feito a quatro mãos, com direção do jornalista e escritor
Sérgio Cunha, e produção de Flávia Flores, o filme se apoia na história da
“Loira do Bonfim”, personagem do além que perambula pela cidade. E mistura esse
enredo à violência de gênero contra mulheres.
A experiência é rápida. O curta tem três minutos de duração
e é filmado com um celular, na vertical (formato típico para o consumo ágil das
redes sociais).
Na tela, o espectador é levado a entender que a protagonista
solicitou uma corrida por carro de aplicativo e tentou levar o motorista para
seus domínios, o Cemitério do Bonfim, na capital mineira. Prática atribuída à
mulher que alguns belo-horizontinos juram ser real.
"Fazer cinema"
A narração amarra duas histórias que, até então, estavam
posicionadas em pontos diferentes da sabedoria popular: de um lado, a lenda da
década de 1940 da noiva abandonada no altar, que morreu de desgosto e que, há
décadas, perambula por Belo Horizonte seduzindo homens para vingar suas dores.
Do outro, o histórico de silenciamento e violências contra
mulheres, que se perpetua há séculos. No entanto, o esforço dos realizadores de
‘fazer cinema’ se enfraquece na tela. Enquanto o discurso tenta sustentar a
obra, as imagens perdem a oportunidade de se aproximar da lenda da noiva
vingativa.
O apelo à memória coletiva da Loira do Bonfim é uma
estratégia interessante de atrair o público. No entanto, características que
habitam esse imaginário não se apresentam. Quem deseja ver o figurino branco da
personagem abandonada no altar, passará, sim, em brancas nuvens.
Ela nunca foi embora
A analogia entre a história trágica da mulher abandonada,
vítima de irresponsabilidade afetiva, e o cenário frequente de mulheres afetadas
por violência psicológica e física tenta criar a ideia de que situações
semelhantes à da Loira se repetem.
Com isso, se produzem novas vítimas - que também poderiam
desejar uma resposta seja ela justiça ou vingança. Ou seja, A Loira nunca foi
embora, pois não falta motivação para que outras “Loiras do Bonfim” se
mantenham presentes na sociedade.
Mas isso fica só nas camadas inferiores do curta. Porque, na
tela, a presença dessa mulher não tem lá muita força. A quase-ausência da noiva
vingativa tenta conferir uma aura sobrenatural à personagem ali retratada - e a
mulher do além, obviamente, não faz questão de ser amplamente vista.
Questões técnicas
Em suma, a entrega deste produto audiovisual é um ato de
coragem. Duas pessoas realizando uma obra de resgate (ou manutenção) da
crendice popular é um feito interessante. No entanto, a execução não entrega
nada que salte aos olhos - nem pelo encanto, nem para o susto do sobrenatural.
A edição com ar de experimental, a precariedade do som e a
música cujos cortes chamam mais atenção do que a trama são questões técnicas
que pesam. Se a memória da Loira do Bonfim promete durar ainda muito tempo, o
curta não parece que terá a mesma sorte.
Direção: Sérgio Cunha
Roteiro: Sérgio Cunha, Flávia Flores
Produção: Flávia Flores
Câmera: Flávia Flores, Sérgio Cunha
Edição: Flávia Flores
Duração: 3'19”
País: Brasil
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