25 abril 2020

Uma história e várias versões sobre a vida (secreta?) pós-celular, ambas na Netflix

(Montagem sobre fotos: Divulgação)

Mirtes Helena Scalioni


Marido e mulher - ele cirurgião plástico, ela psicóloga - recebem em casa para um jantar dois casais e mais um amigo desacompanhado. O clima é de confraternização, quase festa, no início da comédia "Nada a Esconder". A princípio, todos estão ali para apreciar, da varanda, um prometido eclipse lunar. Nota-se que há intimidade entre eles como se conhecessem há anos. 

O único que está solteiro é Pepe, que já chegou se desculpando por não trazer a namorada nova: ela está doente - foi o que ele disse, para decepção de todos, que esperavam conhecer, enfim, a nova namorada dele. Nada mais corriqueiro e natural do que um jantar entre velhos amigos de classe média alta, o vinho rolando generosamente, o anfitrião na cozinha preparando pratos sofisticados.


O clima começa a mudar quando um dos personagens sugere que todos coloquem seus celulares sobre a mesa e que, a partir daí, todas as ligações, notificações e mensagens sejam abertas e lidas publicamente. O jogo, a princípio interessante e engraçado, passa a gerar uma certa tensão quando máscaras começam a cair, traições vêm à tona, revelações criam conflitos, segredos comprometem relações de casais e velhas amizades. 


De tão contemporâneo, instigante - e por que não? - divertido, esse mesmo roteiro de "Nada a Esconder", que foi filmado a primeira vez em 2016 pelo italiano Pablo Genovese com o nome de "Perfetti Sconosciuti", já ganhou versões em produções na Grécia, Espanha, Turquia, Coreia do Sul, China, Polônia, França e México. Um fenômeno. As duas últimas montagens, ambas de 2018, a mexicana e a francesa (além da espanhola), estão disponíveis na Netflix e é quase impossível escolher entre uma delas. Ambas são excelentes.



Na versão mexicana da comédia, que  ganhou o nome de "Perfeitos Desconhecidos" ("Perfectos Desconocidos") como na produção espanhola de 2017, é possível reconhecer as cores mais fortes, o clima quente das discussões e conversas e, claro, o jeito peculiar de interpretação dos atores. Há certo exagero nessa montagem, dirigida e roteirizada por Manolo Caro. Os risos são nervosos, há uma ironia no ar. A equipe de intérpretes é composta por Mariana Trevino, Cecília Suarez, Manuel Garcia-Rufo ("Sete Homens e Um Destino" - 2016), Camila Valero, Miguel Rodarte, Bruno Bichir (série "Narcos" - 2015) e Franky Martin.


Já na produção francesa, "Nada a Esconder", vê-se a fleuma e o charme de um típico encontro entre pessoas que conhecem - e apreciam - um bom vinho, entendem e falam de gastronomia. O ambiente é mais discreto e refinado, os gestos são mais contidos. A direção impecável é de Fred Cavayé e o nome original do longa é "Le Jeu" - "O Jogo", título muito apropriado por sinal. No elenco estão Bérénice Bejo, Stéphane de Groodt, Suzanne Clément, Vincent Elbaz, Doria Tiller, Roschdy Zem, Grégory Gadebois e Fleur Fitoussi.

As duas histórias - mexicana e francesa - são absolutamente iguais, com a ação totalmente desenvolvida numa sala de jantar. As nuances ficam por conta da atuação de atores e atrizes. Em ambas, há um misticismo qualquer no ar por conta do eclipse - a Terra esconde a Lua? Em ambas, devagar, o que vão sendo desnudados são o preconceito, a hipocrisia e a vida de fachada de uma classe média moderninha e charmosa.


Fichas técnicas:
Perfeitos Desconhecidos
País: México
Direção: Manolo Caro
Duração: 1h44
Distribuição: Netflix
Classificação: 14 anos

Nada a Esconder 
País: França
Direção: Fred Cavayé
Duração: 1h33
Distribuição: Netflix
Classificação: 14 anos

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22 abril 2020

Prepare um lençol pra chorar muito com o envolvente "Milagre na Cela 7"

Produção distribuída pela Netflix é para ver de coração aberto (Fotos: Netflix/Divulgação)

Maristela Bretas


Emocionante, envolvente, humano (e também desumano), de uma enorme simplicidade para tratar o amor de pai e filha, "Milagre na Cela 7" ("7. Koğuştaki Mucize"), filme turco distribuído pela Netflix, é imperdível. Remake de uma produção sul-coreana de 2013, esta versão segue uma linha extremamente comovente, impossível não chorar rios de lágrimas com a história de um homem, portador de uma síndrome neurológica, que é separado da filha pequena após ser acusado de um crime que não cometeu. 

Parece um tema simples, mas toda a trama é recheada de histórias paralelas, que se entrelaçam com a de Memo, muito bem interpretado por Aras Bulut Iynemli, e sua filha Ova (a linda e fofa Nisa Sofiya Aksongur, que na época das filmagens tinha 8 anos). A relação entre os dois é encantadora, como se fossem realmente pai e filha. O vídeo abaixo dos bastidores da produção mostra como todo o elenco se envolveu com a adorável garotinha.


O forte do filme são as pessoas, especialmente as mais simples,. Seus hábitos e cultura vão dar o sentido especial da trama. A vida simples e comum de interior não esconde o preconceito por quem é "especial". Das crianças da escola aos militares que o chamam de maluco, Memo é vítima de uma sociedade que não entende as limitações de um adulto com cabeça de criança. Mas para as duas pessoas mais importantes de sua vida - a filha e a avó Fatma (papel de Cecile Toyon Uysal, tarimbada atriz turca de 76 anos), "Lingo lingo", como é chamado por Ova, é o centro de tudo. Uma curiosidade: O nome de Memo é Mehmet, o mesmo do diretor do filme.



É com elas que ele vive uma vida feliz, cuidando das cabras da família, buscando a filha na escola, estudando com ela e ajudando a avó nos afazeres de casa. Mesmo sendo "diferente", o amor pela família é tudo para Memo, até que ele é acusado de ter matado uma menina, filha de um comandante do Exército. Sem um julgamento justo, Memo é condenado à morte e mandado para a prisão até a data de sua execução. Impedido de ver a filha e a avó, ele não entende o que aconteceu e só poderá contar com os companheiros da Cela 7 para tentar provar sua inocência. 


A condenação retrata bem a questão dos direitos humanos desrespeitados no país na época. Torturado, desacreditado, Memo não perde a pureza de alguém de bom coração. Aos poucos vai conquistando, um a um, os companheiros de cela e também quem vive a rotina de uma prisão. Com uma ajuda especial, ele consegue fazer com que, até mesmo os mais durões, coloquem pra fora o que lhes causa maior aflição e se libertem de seus pecados. No elenco, outros atores turcos, apesar de desconhecidos do público brasileiro, também se destacam no drama: Illker Aksum (como Askorozlu, líder dos presos na cela 7), Deniz Baysal (professora Mine) e Sarp Akkaya (o diretor da penitenciária).



Ambientado no interior da Turquia e todo falado no idioma de origem, com legendas em português, "Milagre na Cela 7" tem também na fotografia outro ponto forte. O diretor Mehmet Ada Öztekin soube explorar bem o belo visual da região onde foram feitas as locações. E usou bem a luz e o jogo de câmera nas cenas de tortura e execução. Também o figurino é bem fiel aos costumes da época, no início dos anos 2000. A trilha sonora, composta por Hasan Özsut somente com canções turcas, completa essa bela produção que está encantando milhares de pessoas. Um conselho: assista de coração aberto e um pacote de lenços de papel na mão.



Ficha técnica:
Direção: Mehmet Ada Öztekin
Produção: Lanistar Media / Motion Content Group /CJ Entertainment Turkey
Distribuição: Netflix
Duração: 2h12
Gênero: Drama
País: Turquia
Classificação: 16 anos
Nota: 5 (0 a 5)

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