10 julho 2021

"Pedro e Inês, O Amor Não Descansa" leva poesia e o amor quase impossível para as telas do cinema

História é contada em três épocas distintas, empregando os mesmos atores principais - Joana de Verona e Diogo Amaral (Fotos: Pandora Filmes/Divulgação)

Jean Piter Miranda


Paixão que nem o tempo separa. Essa é a história de “Pedro e Inês, O Amor Não Descansa”, coprodução entre Portugal, França e Brasil que entrou em cartaz nos cinemas nessa semana em várias cidades brasileiras (exceto Belo Horizonte). O longa conta a história do casal que luta para ficar junto em três épocas distintas - passado, presente e futuro. A obra, uma adaptação do romance “A Trança de Inês”, de Rosa Lobato Faria, foi a mais vista pelos portugueses este ano.



Para começar a entender é bom recorrer a uma história real muito conhecida em Portugal sobre Dom Pedro I. Ele tinha uma amante, Inês de Castro, com quem não pode se casar, quando ainda era príncipe. Ao assumir o trono, o rei ordenou que Inês, já morta, fosse desenterrada e, postumamente, colocada no trono e coroada rainha.

A história de Dom Pedro I, passada na Idade Média, é uma das que são contadas no filme. A outra, embora futurista, é ambientada em uma pequena comunidade cheia de regras rígidas. E a narrativa vivida no presente é bem urbana e pode se dizer que se passa nos dias atuais. Em todas elas, Pedro e Inês se encontram, se apaixonam, mas não podem ficar juntos.



Ou melhor. Eles podem ficar juntos. Não sem problemas. Não sem enfrentarem as consequências. As leis, os costumes, a família e, principalmente, o fato de que Pedro sempre está de certa forma comprometido. Ele nunca está livre quando encontra com Inês. E a separação trágica parece sempre inevitável, por mais que se tente fugir disso. Destino? Predestinação?


O ponto de destaque do filme é que, nas três histórias, os atores são os mesmos - Diogo Amaral (Pedro) e Joana de Verona (Inês). Mudam os cenários, as roupas e as falas. Mas os rostos são mantidos. Isso facilita a ligação. Há um Pedro narrador, sempre melancólico, fazendo reflexões sobre sua vida, suas dores e sua amada.

Uma narrativa poética acompanhada de fundos musicais que dão uma ambientação especial a cada cena. E sim, as imagens são muito bonitas. O filme foi rodado no verão de 2017 em quatro concelhos do distrito de Coimbra (Cantanhede, Montemor-o-Velho, Lousã e Coimbra), em Portugal.



As cenas são quase todas em ambientes fechados. E as histórias vão se intercalando, caminhando para o desfecho. Tem um pouco daquela lenda japonesa, do cordão vermelho que liga duas pessoas. Que faz com que, mais cedo ou mais tarde, elas se encontrem. Em "Pedro e Inês" é como se essa ligação ultrapassasse vidas.

É um filme, de certa forma lento. Se considerarmos o quão acelerado está o mundo. Em tempos de tuites e textos curtos. De fazer tudo ao mesmo tempo. Logo, parar por duas horas para ver uma história de amor é poesia e pode ser uma experiência que cause estranhamento a muitos. Mas é uma obra necessária, que chega na hora certa. Quem quiser tirar um tempo, vai ver que vale a pena.


Ficha Técnica:
Direção e Roteiro
: António Ferreira
Produção: Persona Non Grata Pictures
Países: Portugal, Brasil e França
Distribuição: Pandora Filmes
Duração: 2 horas
Classificação: 16 anos
Nota: 3,5 (0 a 5)

02 julho 2021

Crime em "Mare of Easttown" expõe o lado obscuro de uma comunidade

Série tem como pano de fundo a investigação do assassinato de uma jovem numa pequena cidade da Pensilvânia (Fotos: HBO/Divulgação)


Carolina Cassese


“Neste drama policial original da HBO, a vencedora do Oscar, Kate Winslet ("Titanic" - 1997 e "A Despedida" - 2021), interpreta Mare Sheehan, uma detetive de uma pequena cidade da Pensilvânia que deve investigar um violento assassinato local”. A partir dessa premissa presente na descrição oficial da série, poderíamos facilmente classificar "Mare of Easttown" como mais uma produção do estilo “quem matou”. 

No entanto, a HBO apresenta mais uma vez (assim como fez em "Big Little Lies", "Sharp Objects" e, mais recentemente, com "The Undoing") uma trama complexa, repleta de camadas e dramas humanos.


A minissérie também está disponível no serviço HBO Max, que estreou no Brasil em 29 de junho. Como já explicitado, os acontecimentos da série são desencadeados a partir do assassinato da jovem Erin McMenamin (Caille Spaeny). A detetive encarregada do caso é Mare Sheehan (Kate Winslet, principal nome por trás da série), que ainda sofre com o luto pela morte de seu filho, Kevin. Na medida em que conhecemos os núcleos familiares dos moradores da cidade, observamos que todos estão lidando com questões complicadas. Todos são suspeitos.


"Mare of Easttown" quebra uma velha premissa de muitas produções de suspense - a de que “absolutamente tudo que o diretor escolhe mostrar precisa ser relevante para a resolução do mistério”. Diversos acontecimentos da história são, na verdade, pistas falsas (a técnica de misleading, bastante utilizada pela rainha do crime Agatha Christie) ou informações que contribuem consideravelmente para a construção dos personagens, mas não para o desenlace da investigação.

Até mesmo o personagem Richard Ryan, par romântico de Mare interpretado pelo ótimo Guy Pearce, não tem aquela função clássica de amor romântico da protagonista. “Não é preciso ser para sempre para significar algo”, destaca a namorada da personagem Siobhan Sheehan (Angourie Rice), filha de Mare.


O produtor-executivo da série reforça que a trama é pouco centrada em homens ou no amor romântico. “A maioria dos personagens masculinos nesse programa são maus. Não quero dizer todos, mas a maioria. Assim que comecei a escrever o roteiro, queria escrever sobre a minha casa e eu cresci rodeado de mulheres. Foi essa força e essa solidariedade entre elas que me inspirou”, declarou Brad Ingelsby ao podcast Still Watching.

As relações de amizade e de família são mais do que suficientes para sustentar a série e contar excelentes histórias. Temos de fato a sensação de que os moradores da pequena cidade já se conhecem há bastante tempo e são verdadeiramente familiarizados uns com os outros. Os sentimentos, tanto os de amor quanto os de ódio, parecem ter raízes.


Tal percepção se deve muito ao excelente elenco da produção. É inclusive uma tarefa difícil destacar apenas um nome, ao passo que é necessário citar o maravilhoso trabalho de Winslet, encarregada de interpretar nossa adorável (“pero no mucho”) protagonista. “Pero no mucho” pelo simples motivo de que Mare é real: comete erros, muitas vezes é seca com a mãe (que também pode ser bem direta com ela), nem sempre dá a devida atenção para sua filha, se recusa a cumprir ordens do chefe. Em meio a todas essas contradições, Mare pode ser adoravelmente desagradável ou desagradavelmente adorável. Ela é crível, quase existe, quase tem vida própria.


Além dos excelentes veteranos James McArdle (Deacon Burton), Jean Smart (Helen) e Robert Tann (Billy Ross), o elenco mais jovem de "Mare of Easttown" também não deixa a desejar e protagoniza momentos carregados de dor. Prepare-se: seu emocional provavelmente não ficará intacto com o fim que leva um dos personagens jovens. Outro nome responsável por dilacerar nossos corações é o de Julianne Nicholson (Lori Ross), excelente atriz que entrega muito em cenas difíceis.


O último episódio da minissérie, intitulado "Sacrement", é um show de duas atrizes que, justamente por serem tão espetaculares, nos fazem esquecer que Winslet e Nicholson estão em cena. Naquele momento, vemos apenas Mare e Lori, duas amigas que sofrem, se protegem e se amam. A emocionante cena final é um lembrete importante de que muitas vezes precisamos de tempo (e também de escuta) para lidarmos com nossos machucados e encararmos sótãos empoeirados.

Levando em conta o fato de Damon Lindelof, produtor da série "Watchmen", ser fã assumido de "Mare of Easttown" (há ainda uma gratificante piscadela da série para o Dr. Manhattan), é válido pegar carona numa frase dessa outra excelente produção da HBO. Afinal de contas, “feridas precisam de ar, não de máscaras”.


Ficha técnica:
Direção:
Craig Zobel
Criação: Brad Ingelsby
Exibição: HBO e HBO Max
Duração: média de cada episódio de 60 minutos (1ª Temporada - 7 episódios)
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: Drama / Policial