28 abril 2025

Cine Humberto Mauro celebra a sétima arte com a mostra "Os Trabalhadores vão ao Cinema"

São 130 anos de história, apresentados em mais de 40 filmes que serão exibidos entre os dias
29 de abril e 18 de maio (Crédito: Charlie Chaplin)
 
 

Da Redação

 
Ao longo de 130 anos, o cinema vem refletindo sobre a relação atemporal da humanidade com o trabalho. E será com produções focadas neste tema que o Cine Humberto Mauro exibirá, entre os dias 29 de abril e 18 de maio, a mostra inédita “Os Trabalhadores vão ao Cinema”. 

São mais de 40 filmes de diversas épocas, sessões comentadas por especialistas e obras na plataforma CineHumbertoMauroMAIS, que refletem sobre as várias dimensões do trabalho. A programação completa pode ser conferida clicando aqui.

Entre as produções, de curtas e longas-metragens, estão clássicos como “Tempos Modernos” (1936), “As Vinhas da Ira” (1940) e “Sindicato de Ladrões” (1954). Além de “A Greve” (1925) e “A Negra de…” (1966) e títulos modernos, como é o caso de “Como Enlouquecer Seu Chefe” (1999) e “O Diabo Veste Prada” (2006). 

"As Vinhas da Ira" (Crédito: John Ford)

A Mostra terá entrada gratuita, com retirada de 1 (um) ingresso por pessoa a partir de meia hora antes de cada sessão, na bilheteria do cinema, mediante apresentação de documento de identificação com foto.

A partir do dia 6/5/2025, 50% dos ingressos estarão disponíveis, de forma on-line, 1 hora antes de cada sessão, no site da Eventim. O restante dos ingressos será distribuído presencialmente pela bilheteria, meia hora antes da sessão, mediante a apresentação de documento com foto.

“A Negra de…” (Crédito: Ousmane Sembène)

A história

Em 22 de março de 1895, o curta-metragem “A saída dos operários da fábrica Lumière”, dos irmãos Auguste e Louis Lumière, foi exibido para um pequeno grupo de pessoas em Paris. Já a célebre primeira projeção pública, incluindo este e outros pequenos filmes, aconteceu em 28 de dezembro do mesmo ano, no salão de um restaurante da capital francesa. 

A maior parte da mostra acontece justamente ao longo do mês que celebra lutas e conquistas dos trabalhadores, tendo como marco o feriado de 1º de maio. 

A programação propõe um mergulho nas múltiplas formas através das quais o cinema retratou o universo do trabalho, desde as fábricas do século XIX até os dilemas contemporâneos, passando por questões urgentes que continuam a ecoar na sociedade. 

“Cedo Demais, Tarde Demais”
(
Crédito: DanièleHuillet e Jean-Marie Straub)

Além das exibições tradicionais, a curadoria traz duas sessões comentadas: a primeira acontece no Dia do Trabalho, quando o crítico de cinema e pesquisador Renan Eduardo falará sobre o filme “Cedo Demais, Tarde Demais” (1982), de Jean-Marie Straub e Danièle Huillet. 

A segunda, por sua vez, ocorre no dia 14/5, com o filme “A Classe Operária vai para o Paraíso” (1971), de Elio Petri, comentado pelo curador da mostra, Júlio Cruz. 

Complementando a programação presencial, a plataforma CineHumbertoMauroMAIS contará com uma seleção de nove filmes que também colocam o foco nos trabalhadores, suas lutas e desejos, tais quais “Metrópolis” (1927), “Um Homem com uma Câmera” (1929) e “A Pequena Loja dos Horrores” (1960).

"A Dupla Jornada" (Crédito: Helena Solberg)

Curtas, cinema brasileiro e infantil

O trabalho através de diversas lentes – O cinema brasileiro terá espaço de destaque, com uma seleção que inclui o clássico curta-metragem “A Mão do Homem” (1969), de Paulo Gil Soares, e “As Aventuras de Paulo Bruscky” (2010), um dos filmes do início da carreira de Gabriel Mascaro, diretor recentemente premiado no Festival de Berlim. 

Também integram a seleção o documentário “A Dupla Jornada” (1975), de Helena Solberg, “O Bem Virá” (2021) – longa-metragem inédito em Belo Horizonte –, de Uilma Queiroz, e o aclamado “Sinfonia da Necrópole” (2014), de Juliana Rojas, um dos filmes nacionais mais relevantes da última década, entre outras obras importantes da cinematografia nacional.

A Pequena Vendedora de Sol
(Crédito Djibril Diop Mambéty)

Já as sessões de curtas-metragens prometem surpreender: a primeira, no dia 1º de maio, revisita “A Saída dos Operários da Fábrica Lumière”, explorando seu impacto na história do cinema e elaborando uma ideia de desconstrução do curta pioneiro; 

A segunda, no dia 6/5, celebra a produção do cineasta mineiro Humberto Mauro no Instituto Nacional de Cinema Educativo (INCE); e a terceira, no dia 17/5, apresenta três obras contemporâneas que usam o Machinima – técnica que utiliza os videogames como cenário –, explorando o universo do trabalho nos tempos atuais.

Para o público infantil, destaca-se a exibição de “A Pequena Vendedora de Sol” (1999), do senegalês Djibril Diop Mambéty, exibido com dublagem realizada pelo projeto Versão Brasileira, primeira iniciativa cultural que promove a acessibilidade e a exibição, nas periferias de Belo Horizonte, de filmes estrangeiros com pouca circulação no Brasil. 

"O Bem Virá" (Crédito: Uilma Queiroz)

O projeto é idealizado por Luísa Lanna e a coordenação da dublagem foi realizada por Flora Maurício e Maru Arturo. A obra foi dublada por moradores do Morro do Papagaio, em Belo Horizonte. 

O curador da mostra, Júlio Cruz, ressalta que o trabalho é um dos elementos que acompanham a humanidade desde sempre, e com o cinema não poderia ser diferente. “Cada cineasta é atravessado em seu cinema pelas contradições e conflitos materiais e históricos de seu tempo e lugar. Mas o que permanece é esse desejo de pensar sobre a realidade que todos vivemos, a luta por melhores condições de trabalho e como populações específicas enfrentam desafios diferentes”.

Cine Humberto Mauro
(Crédito: Fundação Clóvis Salgado)

Serviço
Mostra “Os Trabalhadores vão ao Cinema”

Datas: 29/4 (terça-feira) a 18/5 (domingo)
Horários: Variados
Local: Cine Humberto Mauro – Palácio das Artes
(Avenida Afonso Pena, 1537, Centro – Belo Horizonte)
Classificação indicativa: Variadas
Programação completa: clique aqui
Informações: (31) 3236-7378 | (31) 3236-7381

27 abril 2025

“Sobreviventes” é um filme necessário para discutir sobre escravidão de forma subvertida

Filme acompanha um grupo de negros e brancos que escapa do naufrágio de um navio negreiro e vai
precisar mudar seu modelo de convivência (Fotos: Hugo Azevedo/Divulgação)
 
  

Marcos Tadeu
Parceiro do blog Jornalista de Cinema



Último trabalho do cineasta luso-brasileiro José Barahona, "Sobreviventes" revisita a disputa do poder em meados do século XIX, após um naufrágio de um navio negreiro. O longa está em cartaz no Cine Una Belas Artes, com produção da Refinaria Filmes (Brasil) e David & Golias (Portugal).

A questão da escravidão é um tema que ainda assombra e se faz presente no século XXI de formas diferentes, mas com resquícios do passado. Barahona entrega um filme histórico e necessário ao tocar nas principais feridas do povo brasileiro.


A colonização do Brasil por Portugal é um exemplo de exploração econômica, violência contra os povos indígenas, implantação de um sistema escravocrata e a tentativa de imposição da cultura europeia. 

O filme acompanha um grupo de homens e mulheres, negros e brancos, que, após escaparem de um terrível naufrágio de um navio negreiro, encontram-se isolados em uma ilha deserta, no Oceano Atlântico, no século XIX. Para sobreviverem, eles agora enfrentam um dilema: reproduzir as hierarquias do passado ou construir um novo modelo de convivência.


Temos todos os tipos de personagens, apesar de algumas vezes caricatos: João Salvador (o escravo), o branco que tenta manter a autoridade, o arrependido, o cruel, mulheres desvalorizadas e somente usadas para reprodução. Impossível não comparar a sociedade que temos hoje com a do passado.

A fotografia em preto e branco de Hugo Azevedo ajuda a fazer o contraste entre raças e seus discursos e ideologias. Um dos maiores acertos da obra é mostrar como, mesmo em uma situação difícil, as pessoas ainda querem manter o domínio sobre as outras. 

Podemos até lembrar do longa “O Poço”, do diretor espanhol Galder Gaztelu-Urrutia, que discute política e fome em uma prisão vertical.


O maior trunfo de Barahona em sua obra é a maneira como ele, em determinado momento, subverte a lógica em relação à escravidão, transformando escravo em senhor e escravizando o homem branco. Tudo isso em uma narrativa densa e dolorosa, mostrando o maior defeito do ser humano: a crueldade.

O cineasta, que era um português branco, faz um filme para negros, para levar o público a pensar e repensar como a escravidão chegou ao Brasil e se impôs sobre outros povos. A colonização e a descolonização mostradas no longa são escancaradas de maneiras diversa e didática, sem enrolação. 


O elenco dá um show de atuação, estrelado pelo mineiro Paulo Azevedo, Miguel Damião, Allex Miranda, Roberto Bomtempo, Zia Soares, Ângelo Torres e Anabela Moreira. Eles conseguem fazer o público ter empatia por seus personagens e, ao mesmo tempo, sentir raiva deles.

A trilha sonora original é assinada por Philippe Seabra, da banda Plebe Rude, e conta com a participação especial de Milton Nascimento em uma das faixas do filme, ampliando sua dimensão simbólica e afetiva.

“Sobreviventes” é um tipo de filme raro de se ver. Ele abre debates sobre a colonização e como o poder e a política funcionam até em uma ilha deserta com pessoas usando suas dores e diferenças para chegar a um objetivo, apelando até mesmo para a violência e a crueldade.


Ficha técnica:
Direção: José Barahona
Produção: Refinaria Filmes (Brasil) e David & Golias (Portugal)
Distribuição: Pandora Filmes
Exibição: Cine Una Belas Artes - sala 3, sessão 19h40
Duração: 1h51
Classificação: 16 anos
Países: Brasil e Portugal
Gênero: drama