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12 maio 2023

“As Órfãs da Rainha” une ficção e história do Brasil colonial para falar de temas atuais e urgentes

Três jovens são enviadas de Portugal pela Rainha para formar as primeiras famílias no Brasil colonizado (Fotos: Persona Filmes/Divulgação)


Mirtes Helena Scalioni


A pergunta inevitável ao final da sessão é: de onde a diretora tirou esse roteiro, que toca em temas tão intrigantes, comoventes e atuais como intolerância religiosa, opressão das mulheres e preconceito, mesmo sendo uma história passada no século XVI, em pleno Brasil Colônia? 

Em mais de 300 livros lidos e outras centenas de documentos pesquisados, é o que tem explicado a mineira Elza Cataldo em suas entrevistas ao longo do lançamento de “As Órfãs da Rainha”, em cartaz nos cinemas da rede Cineart e UNA Cine Belas Artes.


Foi por volta de 1590, em algum lugar do recôncavo baiano, que a diretora Elza Cataldo, junto com os roteiristas Pilar Fazito e Newton Cannito, localizaram a fictícia Vila Morena, onde se passa a trama. 

Em algum momento, aportam naquele ambiente inóspito e hostil, em plena selva, três jovens que teriam sido enviadas de Portugal pela Rainha, com o objetivo, entre outros, de formar aqui as primeiras famílias. E é ali, entre indígenas, escravos negros e imigrantes brancos que as mocinhas tentam sobreviver e escrever suas próprias histórias.


Como convém a filmes bem construídos, “As Órfãs da Rainha” vai entregando, aos poucos, o que levou a tal Rainha de Portugal a enviar aquelas jovens mulheres ao Brasil. A chegada de um grupo religioso com seus conceitos, leis e castigos, em confronto com costumes e cerimônias de imigrantes judeus e indígenas nativos, é, talvez, o ápice do filme, surpreendendo espectadores até então indecisos sobre os rumos daquela estranha história.


Filmado numa fazenda em Tocantins de Minas, na Zona da Mata, o longa ganha contornos de realidade, muito em função de uma nítida pesquisa histórica. Além, claro, da direção de arte de Moacyr Gramacho, a fotografia de Fernando Tamaka e os figurinos impecáveis de Sayonara Lopes e Rosângela Nascimento. No filme fala-se, além de Português, também os idiomas judaico e indígena.


Os atores do filme de Elza Cataldo – a maioria de Minas – são um capítulo à parte. A começar pelas três órfãs, feitas com maestria por Letícia Persiles (Leonor), Rita Batata (Brites) e Camila Botelho (Mécia), o elenco é todo um raro acerto. Destaques para a atuação de César Ferrario como Escobar, o imigrante judeu dono de engenho; Alexandre Cioletti como Thales, o marido violento de Brites; e Juliana Carneiro da Cunha, no magistral papel de Dona Tareja, a cega guardiã das tradições judaicas.

Também merecem destaque Celso Frateschi como o inquisidor, as impecáveis Inês Peixoto (Isabel) e Teuda Bara (Donana) como as feiticeiras curandeiras, e Jai Batista numa interpretação emocionante e convincente de Marta, escrava alforriada que se vê entre a delação e a condenação. 


Há ainda Eduardo Moreira (Padre Jorge), Adana Omágua Kambeba (Apolônia), Mauri Borari (Zomé), Luiz Gomide (Padre Joaquim), Beto Milani (Diogo), Kika Bruno (Paula), Camilo Lélis (Damião), Odilon Esteves (notário). E mais Anderson Kwarai Venite, Israel da Costa Silva, Hugo Tupã Pires de Lima, Kuaray Jekupe Andrey da Silva de Oliveira, Vera’i Cristiano da Silva Oliveira e outros. 


Como se vê, há atores indígenas no filme, alguns falando idiomas originários, o que fortalece a autenticidade do longa.

Enfim, “As Órfãs da Rainha” é muito mais do que um drama histórico. É também um discurso forte sobre a causa das mulheres, tradicionalmente oprimidas e violentadas, e, acima de tudo, um alerta mais do que oportuno sobre os danos do radicalismo religioso. Impossível não aplaudir no final.


Ficha técnica:
Direção e produção: 
Elza Cataldo
Roteiro: Elza Cataldo, Pilar Fazito e Newton Cannito
Realização: Persona Filmes
Distribuição: Cineart Filmes
Exibição: rede Cineart e Una Cine Belas Artes
Duração: 2 horas
Classificação: 16 anos
País: Brasil
Gêneros: história, drama