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06 julho 2023

Comédia “O Crime é Meu” faz rir do absurdo das situações

Filme marca retorno do cineasta François Ozon ao humor (Fotos: Carole Bethuel)


Eduardo Jr.


Uma atriz sem talento e uma advogada se unem para assumir um crime e conduzir uma farsa que vai tirá-las da pobreza em que se encontram, na França dos anos 1930. 

Este pode ser um breve resumo de “O Crime é Meu” ("Mon Crime"), novo filme do cineasta francês François Ozon que estreia nesta quinta-feira (6), distribuído pela Imovision. Em BH, ele poderá ser conferido no Cineart Ponteio e no UNA Cine Belas Artes.


Mas o longa é mais do que isso. É uma comédia inteligente, que diverte e impressiona pela teatralidade na tela. Também é uma homenagem à sétima arte, com referências ao cinema mudo e situações non sense impagáveis, típicas das comédias das décadas de 1930 e 1940. E ainda se posiciona como um retorno do cineasta ao gênero do humor. 



No filme, Madeleine (Nadia Tereszkiewicz) é uma atriz à beira da miséria acusada de ter assassinado um famoso produtor de cinema. Para defendê-la em uma sociedade machista, ela conta com a amiga Pauline (Rebecca Marder), uma advogada mal-sucedida.

Prestes a serem despejadas, elas enxergam que alegar inocência é menos lucrativo, já que testemunhas recebem dinheiro para falar o que sabem. Assumir o crime pode fazer com que elas tenham os holofotes da mídia, permitindo surfar uma onda de fama. 


Qualquer semelhança com a sociedade atual, seria mera coincidência? O julgamento no tribunal se torna um espetáculo, um palco para Madeleine mostrar que pode atuar. 

E também Pauline, a advogada que aproveita seu primeiro grande caso para se posicionar como militante feminista frente a um júri composto apenas por homens. Começa ali a vida de celebridade, com uma confissão de assassinato.  


O filme é metaliguístico porque fala do próprio cinema. Além da homenagem a nomes como Billy Wilder, coloca na tela cenas com estética de cinema mudo para ilustrar o crime, trazendo a encenação pra dentro da encenação. Diálogos rápidos e absurdos fazem lembrar comédias antigas. 

Um dos melhores exemplos disso está na entrada em cena da atriz Isabelle Huppert. Ela vive Odette Chaumette, uma atriz esquecida que quer assumir o assassinato do produtor - não por uma questão de justiça, mas para ter a fama que Madeleine conquistou se dizendo assassina. 


Assim como Madeleine e Odette, outras personagens na trama são exemplos de que a verdade não importa tanto quanto as convenções, o dinheiro e o status. Neste cenário criado e mantido por homens, a predominância de um elenco feminino é outro destaque no filme. 

Ozon dá espaço às mulheres para que ampliem sua voz. Mas não se aprofunda muito em apresentar a história dessas personagens. Vide a curva da personagem Pauline, que passa pela figura da mulher que não é desejada, flerta com a homossexualidade e rapidamente é uma advogada segura e midiática. 


Mas isso é algo que pode passar despercebido, pois o filme é teatral, tem bom ritmo, mal dá tempo pra analisar esse ponto. Os diálogos preenchem os espaços, se emendam ágeis e engraçados. 

O filme, uma adaptação livre da peça francesa de 1934, "Mon Crime", de Georges Berr e Louis Verneuil, é uma comédia capaz de figurar entre as melhores do ano, mesmo que em alguns momentos pareça um deboche da espetacularização que fazemos com tudo.  


Ficha técnica:
Direção e roteiro: François Ozon
Produção: France 2 Cinéma, Playtime, Scope Pictures, Mandarin Cinéma, Foz, Gaumont
Distribuição: Imovision
Exibição: Cineart Ponteio e UNA Cine Belas Artes
Duração: 1h55
Classificação: 14 anos
País: França
Gênero: comédia dramática

01 abril 2023

“A Garota Radiante” retrata dilemas típicos da juventude durante a ocupação nazista

A trama acompanha a transformação de Irène e sua família na França, em meio a um tenebroso contexto histórico (Fotos: Pandora Filmes)


Carolina Cassese
Blog Carolina Cassese


Somando mais de três décadas de bons serviços prestados ao cinema à frente das câmeras, a atriz Sandrine Kiberlain decidiu migrar para o outro lado, se arriscando no ofício de roteirista e diretora. 

O resultado pode ser apreciado em "A Garota Radiante” ("Une jeune fille qui va bien"), em cartaz na sala 2 do Minas Tênis Clube Cinema, sessão das 18h10.

A trama se passa em 1942, quando a França vivenciava a ocupação nazista. A protagonista é Irène (Rebecca Marder), uma jovem que mora com a avó Marceline (Françoise Widhoff), o pai André (André Marcon) e o irmão Igor (Anthony Bajon), com quem divide o quarto. 


Eles vivem numa Paris onde medidas de discriminação contra os judeus vão ganhando força - em uma das cenas, eles têm que entregar telefones, assim como outros itens que facilitem o contato como os outros, e até bicicletas.

A medida que mais atinge a família, porém, é o carimbo da palavra "judeu" nos documentos de cada membro. Em dado momento do filme, vemos Irène com uma identificação amarela em seu próprio blazer. 


Em entrevistas, Sandrine comentou que, propositadamente, não quis mostrar, de modo muito explícito, sinais da ocupação nazista nas ruas e lugares pelos quais Irène transita. A ideia era de que o espectador fosse se inteirando da ameaça pelos olhos da própria personagem. 

É possível se manter alheio a um contexto tão violento? Essa é uma pergunta que permeia o longa, já que a protagonista parece evitar pensar nas ameaças que a rodeiam. 


Uma questão relevante para a obra é a da encenação: a personagem principal é atriz, dentro e fora dos palcos. Simula desmaios, ensaia cenas com os familiares, finge precisar de óculos apenas para reencontrar um oftalmologista que despertou seu interesse.

E o que os olhos de Irène mais refletem no início é o "joie de vivre" da juventude. O brilho da descoberta do primeiro amor e o êxtase de poder vivenciá-lo, ao ser correspondida. As brincadeiras que ainda a ligam à infância, mas que, pouco a pouco, vão perdendo espaço. 


A paixão pela carreira com a qual se identifica. O encanto pela avó, que, como ela mesma ressalta, fuma e tem um ar moderno. O futuro parece ser um horizonte repleto de possibilidades, e, para alcançá-lo, ela conta com o afeto dos colegas, a maioria, não judeus, e o amor de seu círculo.

A estrada está ali, se descortinando à sua frente, e tudo conspira a favor. Bem, não tudo. Pouco a pouco, Irène vai se dando conta da nuvem carregada que se aproxima, e da qual não há muito como fugir.


A iluminação do filme dialoga bem com a gravidade das situações retratadas: em uma das cenas, a paisagem se escurece assim que o pai da protagonista começa a falar sobre perseguições. 

Em determinado momento, a avó e uma companheira judia procuram o conceito de medo no dicionário: “Sentimento de angústia, vivenciado na presença ou pensamento de um perigo, real ou suposto. Por exemplo, uma ameaça”. 

Entretanto, não há definição formal que alcance a intensidade do pavor que acomete as duas. 


Com boas atuações e uma trilha sonora de primeira (que inclui Tom Waits e Charles Trenet), Sandrine entrega um filme comovente, que dá a sua contribuição para que esse período tão maculoso da humanidade não seja esquecido ou mesmo minimizado. 

Mesmo porque, não há mais tempo para inocência. Outros perigos pairam entre nós.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Sandrine Kiberlain
Produção: France 3 Cinéma
Distribuição: Pandora Filmes
Exibição: sala 2 do Minas Tênis Clube Cinema, sessão das 18h10
Duração: 1h38
Classificação: 14 anos
País: França
Gêneros: drama / histórico