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02 novembro 2025

“O Agente Secreto”: o olhar afiado de Kleber Mendonça Filho sobre o Brasil esquecido dos anos 1970

Filme estrelado por Wagner Moura é o indicado do Brasil na disputa pelo Oscar 2026 (Fotos: Vitrine
Filmes e CinemaScopio Produções)
 
 

Maristela Bretas

 
Após ser premiado e aclamado em festivais nacionais e internacionais, “O Agente Secreto” chega oficialmente aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (6). 

Dirigido por Kleber Mendonça Filho e estrelado por Wagner Moura, o filme será finalmente avaliado pelo público em geral — um passo decisivo para confirmar (ou não) sua indicação como representante do Brasil no Oscar 2026.

Em setembro, o colaborador Marcos Tadeu, do blog Jornalista de Cinema, assistiu ao longa no Festival de Cinema de Brasília e escreveu uma análise para o Cinema no Escurinho. Leia a crítica completa em https://tinyurl.com/mryttfza


Reconhecimento e identidade

Premiado em Cannes 2025 com os troféus de Melhor Direção e Melhor Ator (Wagner Moura), “O Agente Secreto” se destaca pela forma como valoriza a regionalidade nordestina e retrata o Brasil dos anos 1970 — um período sombrio, mas mostrado com sensibilidade e profundidade cultural.

O filme é um verdadeiro mosaico de memórias: as frases nas traseiras dos caminhões, o saudoso Fusca amarelo, as novelas e programas como "Os Trapalhões, as brincadeiras de rua, o orelhão e o telefone de fio, o carnaval recifense e, especialmente os cinemas de rua, como o lendário Cine São Luiz, já citado em outro filme de Mendonça, “Retratos Fantasmas” (2023).

Até mesmo o tubarão, figura recorrente até hoje nas praias pernambucanas, ganha presença simbólica na trama, ao ser mostrado ou mencionado em vários momentos do filme.


Enredo e personagens

A história acompanha Marcelo/Armando, interpretado por Wagner Moura — um professor que deixa São Paulo e retorna a Recife, sua terra natal, tentando escapar de um passado violento e misterioso e ficar perto do filho. 

Mas já na chegada, em meio ao animado carnaval da cidade, ele percebe que o passado continua à espreita e, mesmo usando uma nova identidade, ainda corre risco e representa um perigo para todos ao seu redor.

Wagner Moura, como Marcelo/Armando, merece todos os prêmios que vem recebendo como protagonista, mas contou com um time de atores e atrizes de apoio que fizeram a diferença na produção, especialmente com a atuação impecável de Tânia Maria ("Seu Cavalcanti" - 2025).  


Aos 78 anos, com seu forte sotaque potiguar, ela brilha no papel de Dona Sebastiana, uma mulher forte e combativa, que mesmo com os sofrimentos da vida, não perdeu a doçura ao abraçar como filhos os hóspedes de sua pensão. Sua atuação é carregada de emoção e autenticidade.

Outro destaque é o ator mineiro Carlos Francisco, que trabalhou com Mendonça em "Bacurau" (2019) e recentemente em "Suçuarana". Ele vive Seu Alexandre, o projecionista do cinema local. Ele e Dona Sebastiana protagonizam alguns dos momentos mais comoventes do longa, reforçando o tom humano e afetivo da narrativa.

Direção, ritmo e contexto histórico

Se a ambientação e as atuações são pontos altos, o ritmo do filme pode causar estranhamento. A trama se desenvolve de forma lenta em boa parte, ganhando fôlego e ação apenas na terceira parte — que, ainda assim, merecia mais tempo de tela.


Kleber Mendonça Filho retrata o Brasil de 1977 a partir do olhar de uma região muitas vezes marginalizada pelo eixo Sul-Sudeste, criando um espelho entre o passado e o presente. 

A ditadura militar é tratada não como um capítulo distante, mas como uma ferida ainda aberta, refletida na violência e nas omissões das “autoridades” da época que são reproduzidas ainda hoje.

O filme termina sem respostas fáceis: atentados e atrocidades cometidas pelos “agentes da lei e da ordem” são reduzidos a manchetes de jornal, sem investigação nem punição — um eco doloroso da realidade brasileira.

Essa abordagem pode confundir parte do público, especialmente diante das lacunas históricas que ainda cercam a ditadura militar. Nesse sentido, o longa poderia explorar o tema com mais clareza, como fez “Ainda Estou Aqui” (2024).

Kleber Mendonça Filho e Wagner Moura
(Foto: Reprodução)
Conclusão

Mesmo com essas ressalvas, “O Agente Secreto” é uma grande produção, digna de representar o Brasil no Oscar 2026. Além das premiações em Direção e Ator, o longa tem potencial para brilhar em outras categorias — Ator e Atriz Coadjuvantes, Trilha Sonora (de Mateus Alves e Tomaz Alves Souza), Fotografia, Figurino, Som, Direção de Arte e Maquiagem.

Um filme que reafirma Kleber Mendonça Filho como um dos grandes nomes do cinema brasileiro contemporâneo — e que nos faz lembrar, com beleza e dor, que certas histórias continuam vivas na memória do país.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Kleber Mendonça Filho
Produção: CinemaScópio Produções, com coprodução da MK2 Productions, Lemming, One Two Films
Distribuição: Vitrine Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h40
Classificação: 16 anos
Países: Brasil, França, Holanda e Alemanha
Gêneros: drama, thriller político

15 setembro 2025

"O Agente Secreto" é o retrato crítico de uma sociedade sem memória

Filme estrelado por Wagner Moura, com direção e roteiro de Kleber Mendonça Filho, estreia em 6 de novembro nos cinemas brasileiros (Fotos: Vitrine Filmes e CinemaScópio Produções)
 
 

Marcos Tadeu
Parceiro do blog Jornalista de Cinema

 
"O Agente Secreto", novo filme de Kleber Mendonça Filho, foi selecionado para representar o Brasil no Oscar 2026 na categoria de Melhor Filme Internacional. O longa vem chamando atenção nos festivais internacionais e já coleciona prêmios como  Melhor Ator para Wagner Moura e Melhor Direção para Kleber em Cannes, além de Melhor Filme em Lima. 

Depois da vitória de "Ainda Estou Aqui" (2024) como Melhor Filme Internacional, cresce a expectativa de novas conquistas. Com estreia marcada no circuito comercial em 6 de novembro, com pré-venda a partir de 16 de outubro, assisti ao filme na abertura do Festival de Brasília, no último sábado.


A trama se passa em 1977. Marcelo (Wagner Moura), professor universitário especialista em tecnologia, que tenta deixar para trás um passado violento e misterioso, mudando-se de São Paulo para Recife em busca de recomeço. 

Ao chegar à capital pernambucana em plena semana de Carnaval descobre que está sendo espionado pelos vizinhos. O refúgio que esperava encontrar se revela um labirinto de perseguições.

Kleber Mendonça Filho (que também dirigiu "Bacurau" - 2019)  constrói uma estética pulsante para abordar um tema ainda atual: o apagamento de pessoas e memórias durante a ditadura. 

Desde as primeiras cenas, evoca ícones como Os Trapalhões, Chacrinha, Tarcísio Meira e Glória Menezes, situando o espectador num Brasil nos anos 1970, marcados por tensões políticas e culturais.


"O Agente Secreto" também remete à questão da identidade: a alternância entre Marcelo e Armando confunde o espectador, revelando como a repressão política forçava mudanças de nomes e vidas. O frevo e o Carnaval atravessam a narrativa, ora como festa popular, ora como pano de fundo de violências e possíveis assassinatos.

Com 2h40 de duração, divididas em capítulos, o longa mescla narrativa calma e peso histórico. A devoção ao cinema aparece em detalhes afetivos — como o filho de Marcelo, fascinado por tubarões, mas impedido de assistir ao clássico de Steven Spielberg — reforçando a relação íntima entre lembranças, família e a sétima arte, algo já presente em "Retratos Fantasmas" (2023).


Outro recurso marcante é o uso da morte de uma figura importante mostrada apenas por meio de jornais, um gesto que reforça a memória documental e abre margem para que o espectador imagine as circunstâncias do crime. 

Kleber já declarou apreciar esse tipo de recurso, pois permite dar continuidade à história sem precisar mostrar tudo em cena.

Se há um elemento que pode dividir opiniões, é o fato de Wagner Moura se desdobrar em mais de um personagem. Essa estratégia, embora potente, pode afastar parte do público da imersão. 


A escolha lembra o que M. Night Shyamalan fez em "Fragmentado" (2017), ao explorar como o tempo e as memórias moldam identidades distintas em um mesmo corpo.

Além de Wagner Moura, o elenco conta ainda com nomes conhecidos do cinema brasileiro, como Maria Fernanda Cândido, Gabriel Leone, o mineiro Carlos Francisco. Alice Carvalho, entre outros.

"O Agente Secreto" reafirma o olhar político e sensível de Kleber Mendonça Filho, transformando a jornada de um homem em espelho da memória coletiva brasileira.


Ficha técnica:
Direção e roteiro:
Kleber Mendonça Filho
Produção: CinemaScópio Produções, com coprodução da MK2 Productions, Lemming, One Two Films
Distribuição: Vitrine Filmes
Exibição: estreia dia 06 de novembro nos cinemas
Duração: 2h40
Classificação: 16 anos
Países: Brasil, França, Holanda e Alemanha
Gêneros: drama, thriller político