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29 janeiro 2025

"Trilha Sonora Para Um Golpe de Estado" mistura jazz, colonialismo e muita criatividade

Documentário chega aos cinemas brasileiros após conquistar vários prêmios em festivais internacionais
e é forte candidato ao Oscar 2025 (Fotos: Pandora Filmes)


Eduardo Jr.


Sem os mesmos holofotes de obras como “Ainda Estou Aqui”, “Emília Perez” ou “Wicked”, o longa “Trilha Sonora Para um Golpe de Estado” ("Soundtrack To a Coup D’Etat"), indicado ao Oscar 2025 para o prêmio de Melhor Documentário, chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (30) e promete agradar bastante ao público. 

Dirigido pelo cineasta belga Johan Grimonprez, o longa costura de forma genial o colonialismo da Bélgica sobre o Congo, o interesse internacional no país que buscava ser independente e a produção musical do jazz norte-americano entre as décadas de 1950 e 1960. A distribuição fica a cargo da Pandora Filmes. 


O documentário chama a atenção não só por reunir nomes como Malcolm X, Nina Simone e Thelonious Monk, mas porque, desde a estreia no Festival de Sundance em 2024, vem conquistando prêmios como o Especial do Júri por Inovação Cinematográfica, Prêmio de Melhor Roteiro e de Melhor Montagem pela Associação Internacional de Documentários. 

Tudo começa com a apresentação dos artistas Abbey Lincoln e Max Roach, que entraram em uma assembleia da ONU para denunciar o assassinato do líder congolês Patrice Lumumba. 

Este, que pode parecer um spoiler, é apenas o primeiro passo para uma trilha investigativa sobre tudo o que foi arquitetado para que Bélgica e Estados Unidos mantivessem seus planos imperialistas sobre o país africano. 


E como o jazz se funde a essa trama? A frase de Max Roach pode ser vista como resposta: “Nós usamos a música como uma arma contra a desumanidade do homem contra o homem”. A linguagem universal da música foi o suporte para contar partes dessa história. 

No desenrolar do documentário o espectador vai descobrindo como os Estados Unidos tentaram se aproveitar do talento de artistas como Dizzy Gillespie e Louis Armstrong, como a Bélgica se comportava no papel de colonizadora e como a ONU foi usada nesta trama. Tudo isso costurado com maestria na edição de Rik Chaubet e no design de som de Ranko Paukovic. 


A excelente produção de arquivo de Sara Skrodzka entrega entrevistas, discursos políticos da época e apresentações musicais que aderem perfeitamente à obra, construindo uma narrativa que impressiona. 

Grimonprez, além de dirigir, roteiriza uma obra que tem força para se manter na memória, tamanha inventividade colocada na tela. Trata-se de uma visão anti-imperialista, criativa e educativa, posto que tal capítulo da história mundial não se ensina nas escolas (eu, pelo menos, não tive uma aula tão esclarecedora sobre esse golpe). E certamente, as aulas que tive foram mais exaustivas, enquanto as duas horas e meia do documentário desfilaram hipnotizando meu olhar. 

E parece jazz. Dá a impressão de certa desordem em alguns instantes, provoca tensão, mas no final tudo se harmoniza e você se pega até sorrindo com a genialidade da obra. 

Tal qual um show de blues, pode ser um documentário apresentado em um palco à meia luz, mas no final, aposto que você aplaudir. Confira e me conte. 


Ficha Técnica:
Direção: Johan Grimonprez
Distribuição: Pandora Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h30
Classificação: 14 anos
Países: Bélgica, França, Holanda
Gênero: documentário

08 agosto 2021

Documentário “Elvis Presley – The Searcher” mostra por que o ídolo continua vivo

Série em dois episódios mostra a influência de diversos gêneros musicais nos sucessos do inesquecível Rei do Rock (Fotos: Divulgação)


Mirtes Helena Scalioni


Diversos provavelmente vão se queixar: faltou intimidade, novidades sobre o homem, fofocas, segredos. Mas basta um olhar mais atento para entender e aceitar de cara boa a série documental “Elvis Presley – The Searcher” (2018), da HBO Documentary Films, em exibição na Netflix. A começar pelo título, faz todo o sentido chamar o artista de “buscador”, “pesquisador”. Afinal, em sua curta carreira, ele nunca deixou de procurar influências, recriar e inovar.

Dirigida por Thom Zimny, a série de dois episódios tem pouco mais de três horas de duração, tempo necessário para contar, principalmente, a infância do menino pobre que nasceu em Tupelo, no Mississipi, e que, ainda adolescente se mudou para Memphis, no Tennessee, onde foi praticamente descoberto cantando numa festa de colégio.


O doc não deixa dúvidas sobre as primeiras influências do Rei do Rock. Definitivamente, ele era um cantor de “alma negra gospel'', por mais estranho que isso possa soar hoje. A cantoria dos pretos nas igrejas da sua infância foi fundamental na carreira do cantor de voz possante e de longo alcance. 

Do gospel ao country, passando pelo autêntico blues, ele cantou, exaustivamente, pelo simples prazer de cantar, na Beale Street, a famosa rua de bares em Memphis. E haja blues.


É possível que o documentário tenha se prendido mais à infância do cantor, mas os fãs vão adorar saber, por exemplo, que ele foi um filho exemplar, eternamente amoroso e cuidadoso com sua mãe, Gladys. Na verdade, a série deixa transparecer que Elvis foi um bom rapaz, mesmo no seu auge, nos anos de 1960, quando o mundo vivia as rebeliões raciais e sociais e o boom das drogas.


A maior rebeldia do Rei do Rock foi a sensualidade, arma que ele soube usar naturalmente, mas que não serviu de nada quando ele foi convocado pelo Exército norte-americano, no auge da fama, para servir na Alemanha. Há quem diga que foi uma retaliação do governo aos requebros e ao som negro que ele fazia. Resignado, Elvis interrompeu a carreira por dois anos. Os fãs, pacientemente, esperaram.


A resignação, aliás, parece resumir bem a carreira de Elvis Presley, que fez dezenas de péssimos filmes sem querer, se matava em turnês desumanas e foi explorado por um agente que nunca permitiu que ele saísse dos Estados Unidos. O palco, onde ele exercia com maestria, talento e carisma – com resposta sempre apaixonada do público -, parece ter sido seu suficiente lugar.


Jornalistas, produtores, engenheiros de som, amigos e artistas como Bob Dylan e Bruce Springsteen enriquecem, com seus depoimentos, o documentário muito bem amarrado pelo roteiro de Alan Light. A ex-mulher Priscila Presley, claro, também comparece, com entrevistas e filmes caseiros da possível vida doméstica do ídolo, falecido no dia 16 de agosto de 1977.


Saber de Elvis Presley é sempre bom. Melhor ainda é ver imagens inéditas, rever pedacinhos de seus mais de 30 filmes e 1.600 shows e ouvir, de novo, pelo menos 18 dos sucessos mais conhecidos desse artista impecável que gravou – em algumas edições definitivas - mais de 750 canções. Deve ser por isso que dizem que ele não morreu.


Ficha técnica:
Direção: Thom Zimny
Produção: HBO Documentary Films (2018)
Exibição: Netflix
Duração: 3h35 (em dois episódios)
Classificação: Livre
País: EUA
Gêneros: documentário / série / biografia

23 abril 2021

“A Voz Suprema do Blues” é movido pela força de Viola Davis e Chadwick Boseman

A ação se passa dentro de um abafado e quente estúdio onde a banda ensaia para a apresentação (Fotos David Lee/Netflix)


Wallace Graciano

Era meado de 2020. Em meio às manifestações do Black Lives Matter, o diretor George C. Wolfe queria lançar “A Voz Suprema do Blues” ("Ma Rainey's Black Bottom") para reforçar a importância do negro em toda a história norte-americano. Ele foi voto vencido. 

A película só foi ao ar na Netflix em dezembro do mesmo ano. Porém, bem a tempo de consagrar as atuações titânicas de Viola Davis (Ma Rainey) e Chadwick Boseman (Leeve), que, não à toa, foram indicados ao Oscar de melhor atriz e melhor ator, respectivamente.


As quase duas horas de duração do longa, que é baseado na obra teatral de August Wilson, se passam em um pequeno estúdio de Chicago, em 1927. Nele, a já consagrada “Mãe do Blues”, Ma Rainey, está prestes a soltar sua voz em mais um potencial sucesso. Para tal, conta com sua talentosa banda, onde o ambicioso (e talentoso) trompetista Leeve quer dar o salto para outro patamar.


Porém, o abafado e quente estúdio, que sofre com a falta de ventilação, acirra os ânimos de um conjunto que deseja se impor perante uma gerência branca que quer controlá-los a todo custo. E é nesse momento que a trama ganha seu ápice. A atmosfera sufocante e tensa eleva ainda mais a atuação de Davis e Boseman, que roubam a atenção por completo do espectador, deixando o cenário, o figurino e o roteiro em segundo plano.


Para destacar ainda mais esse clima, a direção acertou ao apostar em cores fortes para o cenário que envolve os personagens, fazendo com que a película ganhe um ambiente quente e claustrofóbico, onde a respiração fica ofegante pelo clima e diálogos que a circundam. Somado a isso, essa escolha deu brilho aos protagonistas, que se destacam no cenário vibrante.


Ainda que tenha um roteiro convincente, “A Voz Suprema do Blues” se supera ao trazer ao espectador um filme onde seus protagonistas elevam a dramaturgia ao ápice, fazendo com que as duas horas de duração tenham suas respectivas assinaturas a cada quadro. Davis e Boseman, que infelizmente nos deixou em agosto do ano passado, são gigantes e imponentes.


Ficha técnica:
Direção:
George C. Wolfe
Exibição: Netflix
Duração: 1h34
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: Drama / Musical