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09 março 2024

"Ficção Americana" é uma crítica à exploração de clichês e estereótipos negros

Filme baseado no romance "Erasure" (2001), de Percival Everett, tem Jeffrey Wright como protagonista e concorrendo ao Oscar 2024 (Fotos: Amazon Prime)


Silvana Monteiro e Jean Piter


Com uma perspectiva étnico-racial, "Ficção Americana", disponível no Prime Vídeo, busca entreter por meio de sátira e crítica aos clichês e estereótipos negros explorados pela indústria cultural para atrair público e alcançar sucesso. As brilhantes atuações renderam reconhecimento do longa, dirigido por Cord Jefferson, em importantes categorias do Oscar 2024, com indicações para Melhor Filme, Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Trilha Sonora Original.

Com um enredo envolvente e peculiar, "Ficção Americana" retrata a luta de Thelonious "Monk" Ellison (interpretado por Jeffrey Wright), um brilhante escritor negro em busca da forma ideal para entrar no fluxo editorial que o leve a ser mais valorizado. 

A habilidade de Wright em dar vida a Monk é impressionante, o que lhe rendeu uma indicação ao Oscar de Melhor Ator. O diretor Cord Jefferson soube explorar com louvor as expressões, sentimentos e conexões sociais do protagonista.


Outro que merece destaque é Sterling K. Brown, indicado na categoria de Melhor Ator Coadjuvante. O ator é conhecido por sua excepcional performance como Randall Pearson na série "This is Us" (2016-2022), em exibição no Star+. 

São marcantes também as presenças de Issa Rae, a poderosa criadora da série da HBO, "Insecure”, de Erika Alexander (2016-2021), e Tracee Ellis Ross, da série “Black-Ish” (2014-2022), exibida no Disney+, que elevam a narrativa a outros patamares.

O filme é baseado no aclamado romance "Erasure" de Percival Everett, publicado em 2001. Monk cada vez mais frustrado com sua carreira e enfrentando desafios com sua mãe, recebe a ordem de escrever algo "mais negro" e decide redigir um livro sob um pseudônimo. 


Nessa obra, ele explora, ao extremo, todos os clichês e estereótipos negros, seguindo uma fórmula que observou ter funcionado para outros escritores negros, como Sintara Golden, interpretada por Issa Rae. 

No entanto, para sua surpresa e conflito moral, aquilo que ele escreveu com deboche, proporciona sucesso estrondoso a seu livro e faz com que ele se torne "a obra do ano".

"Ficção Americana" cativa os espectadores com uma narrativa poderosa, abordando críticas étnico-raciais e socio-raciais, além de dilemas moral e ético. É um filme que desafia convenções e levanta questões importantes sobre a representação do negro, sobretudo nos mercados editorial e cinematográfico, e a exploração dessa temática em busca de sensacionalismo e sucesso hollywoodiano.


A narrativa aborda, de maneira sutil, a questão da diversidade e inclusão, consideradas como a nova responsabilidade social. O chamado “tokenismo”, em que os mercados cultural e editorial enfatizavam a inclusão de negros, porém, muitas vezes, com a presença de apenas um indivíduo, e frequentemente retratado com estereótipos. 

A obra é uma crítica aberta à chamada “lavagem da diversidade”, quando essas iniciativas são tratadas de maneira superficial, como mera obrigação legal, sem um compromisso real com a diversidade e inclusão.

Há também o destaque à linha tênue entre o mercado cultural e de entretenimento, destacando que o segundo busca apenas lucro, sem preocupação com a quebra de estereótipos ou reflexões mais profundas. Isso é evidenciado na forma como as editoras e produtoras buscam apenas o lucro ao adaptar obras para o cinema, sem considerar aspectos culturais mais profundos.


O filme também critica a forma como se espera que as histórias escritas ou protagonizadas por negros sejam limitadas a estereótipos, sem espaço para narrativas que fujam desses padrões. 

A genialidade da trama reside nos recursos inventados por Monk para se manter oculto como autor da aclamada obra, e nos desafios complexos que ele enfrenta como consequência da piada que o torna famoso.

As cenas discursivas com diálogos afiados e satíricos são elementos marcantes que permeiam toda a narrativa. Laura Karpman, a mente por trás da trilha sonora, adotou uma abordagem inovadora ao se inspirar no livro que deu origem ao filme. Ela incluiu trechos instrumentais melancólicos conexos a pitadas de jazz. Uma escolha musical que se integrou perfeitamente à atmosfera do filme. 

"Ficção Americana" vale muito a pena, para negros e não negros, mas principalmente para aqueles que desejam ampliar seu letramento racial e apreciar enredos provocativos.


Ficha técnica
Direção: Cord Jefferson
Produção: MGM Studios
Exibição: Prime Video
Duração: 1h58
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: comédia, drama

04 janeiro 2024

"Patos!" - Aventura emplumada com gosto de déjà-vu

Uma família decide fazer uma viagem que vai ensiná-la sobre diferenças, amizade, gratidão e as belezas e perigos do mundo (Fotos: Illumination/Universal Studios)


Silvana Monteiro
@SilMontheiro


Deixar a zona de conforto, mudança de vida, aventura inesperada, união, solidariedade e empatia são temas explorados na animação "Patos!" ("Migration"), a mais nova comédia de ação do estúdio Illumination, que estreia nesta quinta-feira (4) nas salas brasileiras. 

Nesta temporada de férias, a produtora, conhecida por produções infantis de sucesso como "Minions" (2015 e 2022), a franquia "Meu Malvado Favorito" (2010, 2013, 2017 e o quarto previsto para este ano), "Sing" (2016 e 2021) e "Pets - A Vida Secreta dos Bichos" (2016 e 2019), convida você a embarcar, com uma família cheia de penas, em uma viagem emocionantemente desbravadora, em busca de "novos ares".


A comédia de ação "Patos!" consegue entreter com seu humor peculiar, personagens diferentes e carismáticos, uma história envolvente e um elenco talentoso. Mas o longa acaba pecando ao repetir algumas abordagens já vistas em outros filmes que exploram a relação entre animais e humanos. 

Alguns pontos dão a sensação de déjà-vu. O roteiro assinado por Mike White, criador da premiada série "The White Lotus" (2021) e roteirista de "Escola de Rock" (2003), "Patos!" lembra um pouco a aventura vivida pela arara azul Blue e sua família em "Rio 2" (2014), de Carlos Saldanha. 


Na história, a família Lospatos vive reclusa em um ambiente selvagem, com aquelas típicas paisagens remotas e bucólicas, onde o perigo e a maldade só existem nas histórias contadas pelo pai. Tudo é muito lindo quando se trata da natureza do local. 

Porém, para os dois jovens patos integrantes desse grupo, questionar o pai é um exercício difícil. Ele mal bate as asas por querer apenas manter sua vida pacata, amedrontando a todos quanto aos riscos de mudar a asa de lugar. 


Enquanto o pai Mack está satisfeito em manter a segurança, flutuando incansavelmente em "seu lago" na Nova Inglaterra (EUA), a mãe Pam anseia por agitar as coisas e mostrar o mundo aos filhos, o adolescente Dax e a patinha Gwen. 

Quando um grupo de patos migratórios pousa no lago com histórias fascinantes de lugares distantes, Pam convence Mack a embarcar em uma viagem em família, passando por Nova York até chegar à tropical Jamaica, destino dos colegas turistas.


No entanto, seus planos bem elaborados logo começam a dar errado quando eles seguem na direção oposta aos patos selvagens durante o inverno. 

Essa experiência improvável levará a família Lospatos a expandir seus horizontes, conhecer novos amigos, aprender mais uns sobre os outros e sobre si mesmos de maneiras inesperadas e alcançar mais do que jamais imaginaram ser possível. 


Entre aprender voar a céu aberto e entre prédios de uma grande cidade, o grupo vai conhecer novas espécies de aves e viver desafios incríveis. 

O medo vai dar lugar à coragem e à união de forças, capazes de fazer a família enfrentar todo tipo de situação, desde um grupo de aves excluídas e em situação de rua até humanos criminosos.

A animação conta com um elenco de comédia de primeira linha, com vozes originais de Kumail Nanjiani ("Eternos" - 2021), no papel de Mack; Elizabeth Banks ("As Panteras" - 2019) como Pam; Danny DeVito ("Dumbo" - 2019), que dá voz ao pato ranzinza Tio Dan.

Temos ainda Awkwafina ("Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis" - 2021), a pomba Lelé; Carol Kane, como a garça Erin; Keegan Michael Key, voz de Delroy, um papagaio-da-jamaica, além de Caspar Jennings e a estreante Tresi Gasal, como os filhotes Dax e Gwen.


A dublagem profissional brasileira é encabeçada por Sérgio Stern (Mack), que fez a voz do hamster Norman, em "Pets - A Vida Secreta dos Bichos 2" (2019); Priscila Amorim (Pam), dubladora de grandes atrizes como Scarlett Johansson, Zoe Saldana, Natalie Portman, Anne Hathaway, entre outras; Sam Vileti (Dax) e Melinda Saide (Gwen). 

Completam o time, artistas da TV: Cláudia Raia (Erin), Ary Fontoura (Tio Dan), Danni Suzuki (Lelé) e o chef de cozinha Henrique Fogaça (Chef).

Vale à pena conferir essa aventura emplumada e refletir sobre os temas universais de família, amizade, empatia, solidariedade e descobertas pessoais. Tudo isso ao som de uma animada trilha sonora composta por John Powel.

"Patos!" é uma animação que pode agradar a espectadores de todas as idades e uma boa pedida para uma deliciosa reunião familiar na sala de cinema.


Ficha técnica:
Direção: Benjamin Renner e Guylo Homsy
Roteiro: Mike White e Benjamin Renner
Produção: Illumination Entertainment e Universal Pictures
Distribuição: Universal Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h22
Classificação: Livre
País: EUA
Gêneros: comédia, ação, animação, aventura, família

28 dezembro 2023

"Love Victor", a série que inspira pais e filhos

Michael Cimino interpreta o protagonista que teve de aprender a lidar com suas descobertas e encontrar respostas (Fotos: Hulu/Star+)


Filipe Matheus
Youtube Comentando Sucessos


Tem momentos de nossa vida em que ficamos confusos e sem saber como reagir às descobertas de nossa trajetória. Original da plataforma Hulu, a série "Love Victor", em exibição no Star+, mostra a realidade de uma geração que sofre por não entender os seus sentimentos, que busca a aceitação e o direito à liberdade, longe da opinião alheia. 

Victor é um estudante do ensino médio que teve de aprender a lidar com suas descobertas e encontrar respostas na raça, especialmente aos 16 anos. 

A história da série se torna ainda melhor graças à surpreendente atuação de Michael Cimino como Victor. Ele passa emoção ao telespectador. É a ficção mostrando a vida real. Rachel Hilson (Mia), George Sear (Benji), Antony Turpel (Felix), Bebe Wood (Lake), Mason Gooding (Andrew) também estão na série.


A trama fala sobre sexualidade e como se entender é importante para a autoaceitação. Além de abordar laços familiares, os episódios levam o espectador a pensar como tem agido com os filhos e como a forma correta é importante para a construção de uma família feliz e sem rótulos. 

Mostra ainda que adolescentes têm sentimentos e sofrem com perdas, traumas e as novidades que aparecem em suas vidas. 


A sequência, que é adaptação do filme "Com Amor, Simon" (2018), apresenta depoimentos e vitórias que fazem o protagonista mergulhar na procura da tão desejada felicidade. 

Faço aqui uma crítica ao cancelamento da série na terceira temporada. Se a produção trata de um tema tão real e atual, por que acabar? Como fica o telespectador que se identifica com o personagem? Deixou um vazio estranho. Faltam respostas às perguntas de pessoas que se deparam com a mesma realidade de Victor.


Curiosidades não faltam na produção. Nick Robinson, que atuou no longa inspirado na série, é um dos produtores dessa obra-prima e também tem participação como Simon Spier. 

Segundo o site Rolling Stones, Michael Cimino se inspirou no primo homossexual para a construção do personagem. "As experiências e lutas de meu primo me fizeram entender melhor o que é passar por isso e, assim, construir o caráter de Victor". 


Incredible, dynamic, and marvelous. Usei o inglês pra falar como a série é positiva, ela não só mostra a realidade, ela entrega. Sua estreia foi em 16 de junho de 2020, e até hoje mantém fãs apaixonados e com a vontade de quero mais. 

Eu fico por aqui, meu caro leitor, mas não se esqueça da importância de como é bom ser você mesmo e viver o agora. Até a próxima.


Ficha técnica:
Criação: Isaac Aptaker e Elizabeth Berger
Produção: The Walk-Up Company, Temple Hill Entertainment, 20th Century Fox Television
Distribuição: Star+
Exibição: Star+ e plataforma Hulu
Duração: 3 temporadas
Classificação: 14 anos
País: EUA
Gêneros: drama, comédia, série de TV

28 novembro 2023

"Ó Paí, Ó 2" utiliza uma trama simples para reforçar a importância da representatividade negra na tela

Lázaro Ramos protagoniza novamente o personagem Roque, que se une à comunidade para ajudar uma
amiga e preservar a tradição do Pelourinho (Fotos: Divulgação) 


Marcos Tadeu
Narrativa Cinematográfica


Mais de 15 anos após o primeiro filme retornamos ao cortiço de Dona Joana com Roque contextualizando o que mudou ou não nesse período e buscando seu espaço como artista negro. Este é o enredo de "Ó Paí, Ó 2", que está em cartaz nos cinemas. 

O protagonista, novamente interpretado por Lázaro Ramos, persiste em viver de sua música. No longa fica evidente como a cultura branca é mais facilmente aceita e como é mais simples excluir um negro do mercado musical do que inseri-lo.


O cerne deste segundo longa parte de uma premissa simples: todos na comunidade se unem para salvar o bar de Neuzão (Tânia Toko), que foi vendido a outro dono, deixando-a sem teto e sem meios de subsistência. 

Encontramos Dona Joana (Luciana Souza), uma mulher solitária e complexa, ainda lidando com o luto pela morte de seus filhos. Essa ausência a assombra e confronta, levando-a a adotar três crianças de rua. 


A obra aborda a questão do despejo de forma séria, unindo antigos personagens, como Maria (Valdinéia Soriano) e Reginaldo (Érico Brás), Yolanda (Lyu Árisson), mãe Raimunda (Cássia Valle) e Matias (Jorge Washington) aos novos moradores. Eles planejam uma festa para Iemanjá como estratégia para arrecadar fundos e salvar o bar. 

A nova geração demonstra resiliência ao criar o metaverso, utilizando o conceito da internet como um espaço para compartilhar suas experiências sobre os dilemas relacionados à cor da pele, desafiando normas e enfatizando a importância da resistência para superar padrões preestabelecidos. 


É interessante ver como "Ó Paí, Ó 2" se preocupa em mostrar o verdadeiro lugar do negro e onde ele deve se posicionar na sociedade. Talvez a falha esteja em não inserir figuras baianas icônicas no Pelourinho, o que poderia ser uma oportunidade para mostrar como os jovens se relacionam com essa tradição.

Viviane Ferreira, responsável pela direção, reforça a ideia de que os direitos dos negros não devem ser ignorados nem excluídos pela sociedade. O roteiro não apenas discute questões raciais, mas também de gênero e sexualidade, evidenciando a luta contínua da mulher negra e do transexual, visível na tela.


Quanto à parte musical, a produção é só elogios. Lázaro Ramos está maravilhoso em sua performance e voz, unindo não apenas os personagens na tela, mas também atraindo o público espectador. Nomes como Margareth Menezes (que interpreta ela mesma), Baiana System, João Gomes e Olodum contribuem para uma trilha sonora sinérgica e alegre.

"Ó Paí, Ó 2" é leve e divertido, mas também uma peça importante para a cultura negra. Mostra como cada história é relevante, especialmente em um país racista onde, por vezes, o óbvio precisa ser reiterado e exposto.


Ficha técnica:
Direção: Viviane Ferreira
Produção: Dueto Produções, Casé Filmes, coprodução Globo Filmes e Canal Brasil
Distribuição: H2O Films
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h30
Classificação: 14 anos
País: Brasil
Gênero: comédia

21 novembro 2023

“Um Pai, Um Filho” aborda perdas e relações familiares dentro da cultura chinesa

Road movie que mistura drama e comédia é parte da programação de festival gratuito de cinema chinês (Fotos: Gabriela Vargas Mor/Divulgação)


Eduardo Jr.


Se você se pergunta o que esperar de um filme chinês, a resposta pode ser “emoção”, caso a obra escolhida seja “Um Pai, Um Filho” (“Like Father and Son” - 2023). O longa do cineasta Bai Zhiqiang chega ao Brasil como um dos títulos da 8ª Mostra de Cinema Chinês de São Paulo. 

A exposição, online e gratuita, é realizada pelo Instituto Confúcio, na Unesp - Universidade Estadual Paulista, em parceria com a Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, e está disponível na plataforma da Spcine Play: https://www.spcineplay.com.br 


Vencedor do Beijing International Film Festival na categoria “Excellent Product in Progress Award”, o longa mistura drama e comédia. Nele, Gouren (Hui Wangjun) toca a vida enquanto tenta sufocar o sofrimento da perda do filho. Até que seu caminho se cruza com o do endiabrado Mao Dou (Ba Zeze), que sonha reencontrar o pai. 


Neste road movie, Gouren viaja de caminhão por vilarejos, vendendo produtos e tirando fotografias. Uma de suas clientes fotografada é a avó de Mao Dou (Ma Guilan). 

Na apresentação das personagens fica implícito que ela esconde do neto o que realmente aconteceu ao pai do garoto, que idolatra a única foto que tem do homem que deveria criá-lo. 


A revolta e inadequação do menino parecem ser o combustível para que ele deixe o vilarejo o quanto antes para encontrar o pai. A solução está justamente em Gouren. 

O encontro dos dois rende momentos cômicos e tocantes. Junta-se a isso momentos em que a fotografia salta um pouco aos olhos do espectador.  


Embora o roteiro não traga originalidade, na reta final a história parece crescer e encontrar seu eixo. E aí o título da obra passa a fazer sentido, não se referindo estritamente aos protagonistas na tela. Um longa que arranca risos e lágrimas daqueles mais atentos aos aspectos românticos da obra. 


“Um Pai, Um Filho” integra a seleção de 12 obras do Festival, que mistura ficções e documentários, inéditos no país. Os títulos exibidos em cinemas de São Paulo entre 6 e 15 de outubro podem ser conferidos online. Após se cadastrar no site do Instituto Confúcio, o espectador recebe o acesso à programação. A mostra se encerra dia 30 de novembro.  


Ficha Técnica:
Direção: Bai Zhiqiang
Exibição: online e de graça, até 30/11, pelo site https://mostracinema.institutoconfucio.com.br
Duração: 1h37
Classificação: livre
País: China
Gêneros: drama, comédia

11 novembro 2023

“Ainda Temos o Amanhã” é bálsamo para quem precisa suportar viver em uma sociedade machista

Longa integra com brilhantismo a programação do Festival de Cinema Italiano de 2023 (Fotos: Divulgação)


Eduardo Jr.


Um filme sobre a tentativa de se libertar do machismo teria grande possibilidade de ser pesado, triste. Mas em “Ainda Temos o Amanhã” (“C’è Ancora Domani”), o espectador encontra comédia e sensibilidade. A atriz, roteirista e autora Paola Cortellesi é quem assina e protagoniza essa obra, que promete ser uma das melhores das 32 produções em exibição gratuita no Festival de Cinema Italiano. Basta acessar o site até o dia 9 de dezembro - https://festivalcinemaitaliano.com/.

O longa estreou no Festival de Cinema de Roma no final de outubro, sendo escolhido o filme de abertura da edição de 2023. Foi uma das cinco produções pré-selecionadas pela Itália para representar o país na disputa do Oscar de Melhor Filme Internacional em 2024. 


É a primeira obra dirigida por Cortellesi. Filmado em preto e branco, retrata uma Itália pós-guerra, na década de 1940. Delia (personagem de Paola Cortellesi) é casada com o autoritário e violento Ivano (Valerio Mastandrea). 

O casal tem três filhos e a esperança de Delia reside em ver a filha fazer um bom casamento. Até que a chegada de uma carta misteriosa agita a rotina da protagonista. A família não tem posses. Vive em um cortiço, e a casa sugere que eles estão na base da pirâmide social, já que as janelas ficam abaixo do nível da rua. 


Até aí o drama está mais do que presente. Mas a entrada de um rock enquanto Delia caminha num “cat walk”, sem que ninguém a note, traz a comédia. Ao mesmo tempo, escancara a invisibilidade daquela mulher de roupas remendadas.

As idas e vindas de Delia em seus vários subempregos é interrompida pelo passado. Mais precisamente, um passado incompleto. Em uma das cenas mais bonitas do filme, ela se encontra com o mecânico Nino (Vinicio Marchioni). 

O namoro dos dois terminou na juventude, mas dentro deles a paixão ainda respira. E isso é usado para apresentar um pouco mais do passado da protagonista - e também sugerir uma pista para o que está por vir.


Eis que Delia recebe uma carta, que a deixa entre a perturbação e a emoção. Fica claro para o espectador que o tal papel tem o poder de mudar o destino daquela mulher, que escuta verdadeiros absurdos do sogro, da filha e do marido - que também a agride fisicamente. 

Destaco aqui o ponto positivo para a representação da violência doméstica associada a uma dança, e para o recurso utilizado para evidenciar as agressões.

Outro ponto positivo está na trilha do filme. As canções parecem ter sido escolhidas entre as mais belas criações dos últimos tempos, e se colam às cenas com perfeição. O texto também traz graça sem forçar a barra para tirar risos do público. 

Soma-se a isso a surpresa dada ao espectador quando se evidencia que Delia não está totalmente à mercê dos acontecimentos, mas é, sim, capaz de interferir neles.


E as possibilidades de interferência precisam de um empurrãozinho da melhor amiga, Marisa (a natural Emanuela Fanelli). Se não há apoio dos homens da família e tampouco da sociedade, só com as mulheres se ajudando é que algumas situações encontram solução. E a solução para o desfecho da trama é simplesmente EMOCIONANTE!

“Ainda Temos o Amanhã” PRE-CI-SA ser visto na telona! Porque é cinema em estado bruto. São brilhantes a construção e a interpretação da personalidade de Delia. 

Quase duas horas de encanto com a sétima arte - com direito a aula de história no final. Se aqui tivéssemos estrelinhas pra distribuir entre os filmes, este ganharia todas!


Ficha técnica:
Direção: Paola Cortellesi
Produção: Vision Distribution e Wildside
Exibição gratuita: https://festivalcinemaitaliano.com/
Duração: 1h58
Classificação: 14 anos
País: Itália
Gêneros: drama, comédia

09 novembro 2023

“Obrigado Rapazes” usa narrativa suave para falar de recomeço e redenção

Comédia foi uma das pré-selecionadas para representar a Itália na disputa do Oscar de Melhor Filme Internacional de 2024 (Fotos: Divulgação)


Silvana Monteiro


Oportunidades, recomeço, transformação, humanização, descoberta de talentos - tudo isso tendo como foco um ator e uma turma de prisioneiros. "Obrigado Rapazes" (“Grazie Ragazzi") é um filme com direção de Riccardo Milani, estrelando Antonio Albanese, Fabrizio Bentivoglio, Sonia Bergamasco e Giacomo Ferrara. Essa é uma versão do francês "Triomphe", do diretor Emmanuel Corcol, de 2021.

A obra integra a seleção do Festival de Cinema Italiano no Brasil, que começou nessa quarta-feira (8) e vai até o dia 9 de dezembro, com sessões presenciais e pelo streaming, disponíveis gratuitamente no site https://festivalcinemaitaliano.com/.


O remake italiano traz à tona a história de Antonio Cerami, um ator outrora renomado, agora com um trabalho de dublador de filmes “adultos”, que encontra a oportunidade de dar aulas. Entretanto, seus alunos são criminosos em cumprimento de pena. 

O convite recebido de um velho amigo é imediatamente preocupante e, sim, à beira da recusa. No entanto, seu amor pelo ofício de ator e seu encanto pela arte da atuação o fazem prosseguir nessa tarefa. Aqui, a máxima 'missão dada é missão cumprida' é de um êxito inigualável.

Com uma abordagem simples, o enredo mostra Antonio se esgueirando para fazer com que os detentos encenem "Esperando Godot", a famosa comédia de Samuel Beckett, escritor e dramaturgo irlandês ganhador do Nobel de 1969. 


À medida que se entregam à arte, esses criminosos vão se transformando em homens comuns que encontram uma saída para suas emoções, uma maneira de expressar suas angústias e esperanças. É uma história poderosa sobre como a expressão artística pode transcender as barreiras da prisão e tocar o coração humano.

O elenco, liderado por Antonio Albanese, entrega atuações excepcionais, com bastante profundidade e autenticidade. O filme equilibra habilmente o humor e a emoção, proporcionando momentos que arrancam risadas e lágrimas do público. 


A química entre os atores é intensa, tornando a trajetória dos personagens ainda mais envolvente. É importante destacar que Albanese dedicou a maior parte de sua carreira ao humor, porém nesta obra, ele entrega uma dramaticidade inigualável, com pitadas cômicas.

Com duração de 1h57, o filme mantém o público cativo do início ao fim, entregando uma narrativa que flui suavemente e uma direção que nos conduz, de certo modo um pouco previsível, pela jornada conflituosa dos personagens. 

A fotografia do filme é notável, com cenas que nos remetem, ora para dentro, ora para fora, tanto no que diz respeito aos espaços físicos quanto às emoções de cada personagem.


Os pontos altos do filme são os ensaios de vocalização, dicção e encenação que levam o professor a saber mais sobre as limitações e histórias de cada um e de como cada detento leva essa história tão a sério até repetir partes do roteiro entre as grades das minúsculas janelas das celas. 

Das cenas de ensaio, uma vai fisgar ainda mais o telespectador brasileiro por conter um elemento do figurino bem conhecido aqui e internacionalmente. E entre os "intérpretes amadores", para esta cronista que lhes escreve, o destaque vai para Damiano, interpretado pelo ator Andrea Lattanzia, e para as cenas em que ele tenta vencer o desafio de falar, e nem é para o público, falar para si mesmo.


A busca pelo local onde os rapazes irão se apresentar e o momento do espetáculo, entre a coxia e o palco, são outros ápices do filme que mostra a tensão e a ansiedade de Antônio em ver seus alunos na superação do medo e da timidez. Será que ele e os rapazes vão conseguir?

"Obrigado, Rapazes!" é um filme que merece ser visto e apreciado por sua mensagem edificante e sua execução simples, porém brilhante. Uma história de esperança e transformação que nos remete ao poder da arte como uma forma de expressão e como ferramenta para transformar pessoas e ressignificar vivências. É uma boa pedida para alimentar a esperança na humanidade.


Ficha técnica:
Direção:
Riccardo Milani
Produção: Vision Distribution Palomar e Wildside
Exibição: no site oficial do festival - https://festivalcinemaitaliano.com/
Duração: 1h57
Classificação: 12 anos
País: Itália
Gênero: comédia

30 agosto 2023

Comédia de humor refinado, “O Porteiro” quer levar brasileiros de volta ao cinema

Produção nacional que não recorre à apelação, arranca risos do público (Fotos: Laura Campanella)


Eduardo Jr.


Marque em sua agenda: nesta quinta-feira, 31 de agosto, estreia nos cinemas a comédia nacional “O Porteiro”. Acompanhamos a live realizada com o elenco e a pré-estreia do longa em uma das salas da rede Cineart. Dirigido por Paulo Fontenelle (realizador de “Blitz, o filme”, 2019) e distribuído pela Imagem Filmes, a produção arranca risos do público sem dificuldades, por trazer atuações muito boas.

No filme, o porteiro Waldisney (personagem de Alexandre Lino) é mais um nordestino que migrou para o Rio de Janeiro com a família. Morando no “cafofo” dentro do prédio onde trabalha, ele não tem como evitar as situações (cômicas) que complicam sua vida. 


Ele é um homem simples, que não tem habilidade nem pra acalmar a estourada esposa Laurizete, vivida por Daniela Fontan (“A Sogra que te Pariu”, 2022, disponível na Netflix), que dirá capacidade para driblar os problemas. 

Waldisney inicia sua saga na delegacia, prestando depoimento ao delegado, personagem de Maurício Manfrini (“Os Farofeiros”, 2018), que tem na mão um personagem bem diferente dos papéis costumeiros. O que aconteceu e virou caso de polícia, descobrimos ao longo do filme.


Os flashbacks (que a gente esquece que são flashbacks) vão nos contando como as situações foram se amarrando até aquele ponto. E aí os moradores do edifício Clímax vão sendo apresentados. Destaques para a excelente Dona Alzira, vivida por Suely Franco ("Minha Mãe é uma Peça 2", 2016) e a surpreendente e engraçada presença do lutador José Aldo.   

Além destes nomes, a produção conta ainda com Cacau Protásio (“Juntos e Enrolados”, 2022), Aline Campos (“Um Dia Cinco Estrelas”, 2023), Bruno Ferrari (“O Buscador”, 2021), Rosane Gofman (“Confissões de uma Garota Excluída”, 2021) e Heitor Martinez (“Um Natal Cheio de Graça”, 2022). 


O elenco se reuniu em 2022 para as gravações. Se havia alguma insegurança com o período pós-pandemia, não se percebe isso na tela. A atriz Aline Campos revelou que o entrosamento foi tão grande que o diretor precisava pedir silêncio durante as filmagens, de tanto que a equipe se divertia. 

O desafio agora é trazer de volta aos cinemas um público que parece ter se habituado a assistir tudo em casa e não percebeu que o poder do controle remoto de pausar, voltar cenas, interrompe as emoções, faz perder o clima. Sem contar a perda da experiência coletiva nas salas de exibição. 


Outra intenção do filme é reforçar a necessidade de cordialidade para com os porteiros. Embora não seja um filme de militância, algumas pautas não têm como ser omitidas. 

O protagonista Alexandre Lino é natural de Pernambuco e sabe como é ser um migrante nordestino em um grande centro urbano, que muitas vezes apaga essas identidades. Seja pela grosseria de não dar um bom dia, seja sob a desculpa da piada (que geralmente é só manifestação de preconceito). 

Além disso, Lino nos disse que trazer às telas uma comédia nacional, sem o mesmo aparato de marketing de um filme como “Barbie”, por exemplo, é mais desafiador ainda. Principalmente neste momento em que se discute a cota de tela e a necessidade de mais salas exibindo produções brasileiras. 


A aposta de “O Porteiro” é na simplicidade. E o humor chega a ser refinado, já que não apela para o besteirol. A construção da simplicidade de Waldisney vem dos seis anos em que a peça é realizada nos palcos do país. E também é fruto de pesquisa. A equipe visitou portarias de diversos prédios em São Paulo e Rio de Janeiro para ouvir histórias dos profissionais e pedir permissão para retratar isso na telona. 


O resultado é um filme leve, que peca apenas por permitir que algumas cenas se alonguem e pela falta de mais músicas originais (Marília Mendonça nem sempre combina com as cenas). Mas diverte e retrata bem alguns aspectos da cultura brasileira e nordestina. 

"O Porteiro" já se equipara com produções da Marvel, porque tem até cenas pós-créditos. Então, depois que as letrinhas começarem a subir, se prepare pra rir mais um pouquinho. 


Ficha técnica:
Direção: Paulo Fontenelle
Produção: Rubi Produções
Distribuição: Imagem Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h23 minutos
Classificação: 14 anos
País: Brasil
Gênero: comédia

20 julho 2023

"Barbie" é uma hilária e inteligente utopia feminista

Margot Robbie encarna com perfeição a Barbie em sua vida cor-de-rosa que precisa conhecer o mundo real(Fotos: Warner Bros.)


Larissa Figueiredo

Sob as bênçãos do slogan “você pode ser o que quiser”, as Barbies vivem na Barbielândia, sem qualquer contato com o mundo real, acreditando na resolução de todos os problemas de gênero e certas de que mudaram a vida de todas as mulheres para sempre. Essa é a temática de "Barbie", filme dirigido por Greta Gerwig que estreou nesta quinta-feira (20) nos cinemas.

Se antes as bonecas em formato de bebês permitiam que o mais longe que a imaginação das meninas fosse a maternidade, após os anos 1950, Ruth Handler criou uma boneca adulta, com “1001” profissões, que elevou o imaginário infantil e que agora ganhou as telonas.


O roteiro de "Barbie" é inteligente, sutil e profundo. Gerwig escancara, com bom humor, as deficiências de um movimento feminista raso e sem consciência. Todas as mulheres da Barbielândia são bem sucedidas em suas carreiras, independentes, se amam e se apoiam. 

Não há competição entre elas nem sentimentos de insegurança. Tanta sororidade é restrita apenas à Barbie Estranha (Kate McKinnon), que é chamada de estranha pelas costas, à Barbie grávida, e claro,às Barbies que saíram de linha e vivem isoladas.


A Barbie Estereotipada (Margot Robbie) acredita que não existem mais problemas de desigualdade de gênero e que tudo foi resolvido com equidade de oportunidades e salários. Barbie, obviamente, nunca conheceu as sequelas do patriarcado e do capitalismo, e é aí que está a grande intencionalidade da diretora.

Se por um lado as Barbies não competem entre si, os Kens vivem em busca da validação de suas companheiras e brigam, mas sem agressividade (pelo menos no início do filme), pela atenção delas. Na realidade, o estímulo à competição e a necessidade por validação masculina são comumente atribuídas às mulheres.


Por falar em Ken, o ator Ryan Gosling foi primoroso no papel. Apesar das críticas que recebeu nas redes sociais por sua idade e aparência, Gosling deu um show na atuação, na dança e na voz. O ator é um pacote completo de carisma e talento que incorporou o boneco namorado de Barbie, uma das grandes surpresas do longa. 

Greta Gerwig utiliza Ken para falar sobre a fragilidade da masculinidade tóxica e seus riscos, oferecendo um personagem complexo com início, meio e fim. Ele definitivamente não é o vilão.


A Barbie de Margot Robbie entra em uma crise existencial e precisa ir ao mundo real resolver as catastróficas (mas nem tanto) consequências disso. Lá, ela encontra Glória (América Ferrera), uma mãe de família que passa por problemas emocionais, e sua filha Sasha (Ariana Greenblatt), uma garota que não brinca mais com Barbies. 

A ligação entre as três não é óbvia e surpreende o expectador. Apesar disso, a personagem de America Ferrera funciona muito mais como uma representação de todos os dilemas das mulheres comuns do que como uma personagem com emoções próprias que fogem ao imaginário coletivo.


A trilha sonora é um dos pontos mais fortes do filme. As músicas e performances à la Gene Kelly funcionam bem e  ajudam a contar a narrativa de forma simbólica e divertida. “What Was I Made For”, música de Billie Eilish feita para o longa, é emocionante e se encaixa como uma luva na cena em  que é apresentada, uma das melhores do filme. Dua Lipa, que faz a Barbie Sereia, também colaborou com a música “Dance The Night”.

O cenário de "Barbie" é extremamente fiel às casas de brinquedo da boneca vendidas pela fabricante Mattel. Ele foi adaptado ao roteiro como uma grande brincadeira. Não sai água do chuveiro, não tem escadas porque a Barbie flutua, entre outros detalhes intencionais e indispensáveis.


A Barbielândia é coerente e de encher os olhos, o que contribui para uma fotografia digna do Oscar, repleta de planos inteiros que são uma verdadeira experiência cinematográfica. Para os fãs brasileiros, a boa notícia é que a Warner Bros. contratou Flávia Saddy, dubladora da "Barbie" nos desenhos, para dublar Margot Robbie neste live-action da boneca.

Por fim, é impossível não dizer que "Barbie" é um respiro a uma geração de mulheres que sofrem as feridas secretas da capitalização do movimento feminista e da masculinidade tóxica. Como no filme, falar abertamente sobre o tema é um antídoto.


Ficha técnica
Direção: Greta Gerwig
Roteiro: Greta Gerwig e Noah Baumbach
Produção: Warner Bros., Heyday Films,
Distribuição: Warner Bros. Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h55
Classificação: 12 anos
Gêneros: comédia, aventura, família