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25 agosto 2025

"Os Roses – Até que a Morte os Separe": quando o amor vira guerra doméstica

Olivia Colman e Benedict Cumberbatch formam o casal perfeito que passa da paixão a uma relação
decadente e cruel (Fotos: Searchlight Pictures)


Maristela Bretas


Uma bomba-relógio prestes a explodir. Não há mais filtro, nem paciência. As agressões verbais em público tomam o lugar da imagem de casal perfeito. É nesse terreno que “Os Roses – Até que a Morte os Separe” ("The Roses") constrói sua narrativa, fazendo um retrato ácido e, muitas vezes, dolorosamente real de como casamentos longos, aparentemente felizes e ideais, podem ruir.

O longa estreia nesta quinta-feira (28) nos cinemas e traz a direção de Jay Roach, a partir de um roteiro afiado de Tony McNamara ("A Favorita" - 2019, produção estrelada por Olivia Colman, e "Pobres Criaturas" - 2024). A obra é mais um remake do clássico romance de 1981, “A Guerra dos Roses”, de Warren Adler, já adaptado em 1989 por Danny DeVito.


Aqui, o “casal perfeito” é vivido com intensidade por Olivia Colman (Ivy) e Benedict Cumberbatch (Theo). E que dupla! Colman entrega uma Ivy multifacetada, uma chef de cozinha brilhante que vê sua carreira disparar, enquanto Cumberbatch dá corpo a um Theo cada vez mais frustrado e ressentido após perder o emprego de arquiteto renomado.

No início, tudo parece um comercial de margarina: amor, carinho, filhos encantadores e estabilidade. Mas basta um contratempo para o castelo de cartas ruir. A partir daí, os ressentimentos acumulados se transformam em combustível para uma competição tóxica, recheada de implicâncias, disputas públicas e ataques verbais que corroem qualquer traço de afeto.

Humor com desconforto

O humor ácido é a engrenagem que move a trama. Roach não poupa o espectador: ele entrega uma comédia que ri do desconforto, expondo a crueldade que pode se esconder por trás da fachada de família perfeita. Não há espaço para idealizações românticas, mas sim para a amarga constatação de que o amor também pode ser palco de guerra.


“Os Roses – Até que a Morte os Separe” funciona como um espelho distorcido e incômodo. Quem assiste, ri, mas também se reconhece em algum detalhe da vida conjugal. E é justamente aí que o filme acerta: no desconforto que provoca, na tensão crescente que transforma a relação de Ivy e Theo numa batalha sem vencedores.

O elenco conta ainda com os humoristas norte-americanos Kate McKinnon (de "Barbie" - 2023) e Andy Samberg (da série "Brooklyn Nine-Nine"), interpretando o casal de amigos Amy e Barry, que vivem um "casamento moderno", mas que também está desmoronando. São eles os primeiros a chamarem a atenção de Theo e Ivy sobre o desgaste no casamento deles. 


Além da dupla temos outro casal tóxico, vivido por Jamie Demetriou (Rory) e Zoë Chao (Sally) e a rápida, mas marcante aparição de Allisson Janney, como a advogada Eleanor. 

De normais mesmo somente Sunita Mani e Ncuti Gatwa, nos papéis de Jane e Jeffrey, assistentes de Ivy, que tudo vêem e nada comentam.

“Os Roses – Até que a Morte os Separe” é uma comédia, sim. Mas daquelas que deixam gosto amargo, com humor britânico sarcástico e até repreensível em alguns momentos para tratar de amor, ambição e fraquezas. 

Todos esses elementos, sustentados pela brilhante atuação e a química de Colman e Cumberbatch, amigos de longa data, deverão agradar ao público.


Ficha técnica:
Direção:
Jay Roach
Produção: Searchlight Pictures, SunnyMarch, Delirious Media
Distribuição: 20th Century Studios
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h45
Classificação: 14 anos
País: EUA
Gêneros: comédia, drama

20 março 2024

“Pobres Criaturas”: bizarrices e loucuras para falar de libertação feminina e limites éticos da ciência

Filme é tão bizarro e risível, e ao mesmo tempo tão sério e profundo, que causa desconforto ao espectador (Fotos: Searchlight Pictures)


Mirtes Helena Scalioni


Difícil definir, numa só palavra, o filme “Pobres Criaturas”, dirigido pelo grego Yorgos Lanthimos. De comédia dramática a aventura, de ficção científica a fábula, tudo pode se encaixar nesse longa cujo trunfo é – clara e propositadamente - o estranhamento. 

É tudo tão esquisito, tão bizarro e risível, e ao mesmo tempo tão sério e profundo, que resta ao espectador levar para casa o desconforto que permanece ao final da história. O ganhador de quatro Oscar poderá ser conferido a partir desta quarta-feira (20), no canal Star+.



Como um Frankenstein moderno, o Dr. Godwin Baxter, feito na medida por Willem Dafoe, vive de criar seres estranhíssimos em seu estranhíssimo laboratório. Mas nada se compara a Bella Baxter, a mulher que ele criou a partir do cérebro de um bebê. 

Magistralmente interpretada por Emma Stone, Bella é uma espécie de bebê adulto, que precisa aprender a caminhar, falar, comer, se comunicar, mas, principalmente, conviver.

O filme talvez não fosse o sucesso que é sem Emma, que não por acaso, é a vencedora do Oscar de Melhor Atriz de 2024. Ela hipnotiza e confunde o público, que ri e torce contra - e a favor – da personagem em sua difícil jornada em busca de adaptação no mundo.


Com expressão corporal só vista em grandes artistas, Emma Stone dá o tom certeiro de uma Bella Baxter inteligente e libertária, mas sem filtros, aprendendo a viver num ambiente repleto de regras, limitações e etiquetas, ao mesmo tempo em que se mostra sedenta de conhecimento.

Para além das bizarrices, “Pobres Criaturas”, que é baseado no livro do britânico Alasdair Gray, desperta boas reflexões sobre a luta pela libertação das mulheres, cuja sexualidade foi – e é – historicamente tolhida. E ainda esbarra no debate do limite ético – ou a falta dele – nos experimentos científicos. Afinal, o Dr. Godwin Baxter é quase um Deus. Não por acaso, Bella Baxter, sua mais incrível criação, o chama de God.


É preciso falar também das atuações de Ramy Youssef e Mark Ruffalo, que enriquecem o filme com interpretações seguras. O primeiro, como Max McCandless, o romântico noivo de Bella, e o segundo como o astuto advogado Duncan Wedderburn, que a leva para conhecer o mundo. 

São nessas viagens que a estranha criatura descobre, além do próprio corpo, os livros, a filosofia, a esperteza, as diferenças sociais, a miséria e até Deus.


Precioso e impagável é o momento em que Bella Baxter foge do hotel onde está hospedada em Lisboa e sai, sozinha, caminhando a esmo pelos becos e ruelas da cidade. Até que um som chama a sua atenção. Numa varanda, uma mulher toca maravilhosamente um fado. 

Atônita e claramente envolvida pela música, aquela estranha e rústica criatura se deixa envolver e se emociona. Uma cena rápida, mas tocante, que só poderia ser feita – e entendida – por uma grande atriz.


Ficha técnica
Direção: Yorgos Lanthimos
Produção: Searchlights Pictures e Film4
Distribuição: 20th Century Studios
Exibição: Canal Star+
Duração: 2h21
Classificação: 18 anos
País: EUA
Gêneros: drama, fantasia, romance, comédia